The New York Times Quando Zoe Salda\u00f1a se mudou para a Calif\u00f3rnia, ela fez uma peregrina\u00e7\u00e3o ao letreiro de Hollywood, esperando encontrar um totem m\u00edstico e inspirador. Para sua decep\u00e7\u00e3o, encontrou apenas um letreiro. Nada mais, nada menos. “Eu estava tentando tocar Hollywood, e n\u00e3o consegui \u2014\u00e9 como um fantasma”, disse ela. “Mas todos os dias voc\u00ea acorda com aquela ansiedade de que vai toc\u00e1-lo, e ele n\u00e3o est\u00e1 l\u00e1.” Se Hollywood pudesse ser agarrada, poucos atores teriam um dom\u00ednio melhor sobre ela do que Salda\u00f1a. Ela estrelou tr\u00eas dos filmes de maior bilheteria de todos os tempos: “Avatar” e a sequ\u00eancia “Avatar: O Caminho da \u00c1gua”, onde interpretou a feroz alien\u00edgena Neytiri, e “Vingadores: Ultimato”, o encontro da Marvel que apresentou sua personagem de “Guardi\u00f5es da Gal\u00e1xia”, Gamora. Se isso n\u00e3o bastasse, ela tamb\u00e9m participou de tr\u00eas filmes de “Star Trek”. O espa\u00e7o sideral pode ser vasto, mas Salda\u00f1a o conhece como se fosse seu quintal. Nesta era moderna de produ\u00e7\u00e3o de franquias, a atriz de 46 anos acumulou muito capital, mas uma coisa que ela n\u00e3o tinha at\u00e9 agora era um ve\u00edculo de destaque como “Emilia P\u00e9rez”, que recebeu 10 indica\u00e7\u00f5es ao Globo de Ouro, incluindo uma para Salda\u00f1a como atriz coadjuvante. Por outro lado, “Emilia P\u00e9rez” seria uma exce\u00e7\u00e3o na filmografia de qualquer ator simplesmente porque n\u00e3o h\u00e1 outros filmes como ele: dirigido por Jacques Audiard, \u00e9 um drama policial sombrio que tamb\u00e9m \u00e9 um musical. Salda\u00f1a estrela o filme da Netflix como Rita, uma advogada desgastada da Cidade do M\u00e9xico que se torna a solucionadora pessoal de problemas da ex-chefe do tr\u00e1fico Emilia P\u00e9rez (Karla Sof\u00eda Gasc\u00f3n). Um acordo \u00e9 feito: se Rita puder trabalhar em segredo para ajudar Emilia a passar por uma cirurgia de afirma\u00e7\u00e3o de g\u00eanero, ela ser\u00e1 compensada financeiramente al\u00e9m de seus sonhos mais loucos. Mas, mesmo quando Rita ganha acesso aos mais altos escal\u00f5es da sociedade, ela ainda carrega um ressentimento que culmina com “El Mal”, um n\u00famero de m\u00fasica e dan\u00e7a ardente em que ela critica os ricos hip\u00f3critas em um baile de caridade. Essa sequ\u00eancia \u00e9 mais do que apenas o destaque do filme: \u00e9 um clipe de tr\u00eas minutos que exibe tudo o que Salda\u00f1a \u00e9 capaz de fazer, incluindo seu dom atl\u00e9tico de transmutar os humores de suas personagens em movimento. A performance \u00e9 t\u00e3o potente que ela est\u00e1 quase certa de conseguir sua primeira indica\u00e7\u00e3o ao Oscar; de fato, muitos a consideram a atual favorita na categoria de atriz coadjuvante.Essa \u00e9 uma mudan\u00e7a significativa para Salda\u00f1a, que muitas vezes se perguntou, apesar de seu sucesso, se ela \u00e9 realmente vista e apreciada pelo que pode fazer. O mais pr\u00f3ximo que ela chegou de uma indica\u00e7\u00e3o ao Oscar foi pelo primeiro “Avatar”, mas seu trabalho de captura de movimento em um filme de aventura de fic\u00e7\u00e3o cient\u00edfica nunca encontrou resson\u00e2ncia com um corpo de vota\u00e7\u00e3o mais sintonizado com filmes tradicionais. Embora “Emilia P\u00e9rez” esteja longe de ser tradicional, pelo menos apresenta Salda\u00f1a como algo mais pr\u00f3ximo de quem ela realmente \u00e9, sem os artif\u00edcios de efeitos especiais e maquiagem alien\u00edgena. Receber aten\u00e7\u00e3o por pr\u00eamios por essa performance, que \u00e9 entregue principalmente em seu espanhol nativo, tem sido emocionante. “Continuo me lembrando de que, n\u00e3o importa o que aconte\u00e7a, tudo sobre ‘Emilia P\u00e9rez’ foi especial”, disse ela. “Eu estava fazendo isso por mim e, por muito tempo, parei de fazer coisas por mim.” Criada em Nova York e na Rep\u00fablica Dominicana, Salda\u00f1a lutou para deixar sua marca como atriz, destacando-se em filmes menores como “Sob a Luz da Fama” e “Crossroads: Amigas para Sempre” antes de ascender ao papel principal feminino em espet\u00e1culos gigantes de fic\u00e7\u00e3o cient\u00edfica. “Sou muito grata, mas tive que sacrificar muitas coisas”, disse ela. Apesar de seu sucesso, Salda\u00f1a pode ser extremamente cr\u00edtica consigo mesma. Por ser disl\u00e9xica e o ingl\u00eas n\u00e3o ser sua primeira l\u00edngua, ela sempre temeu aprender falas. Outras atrizes podem salivar ao receber um mon\u00f3logo de duas p\u00e1ginas, mas Salda\u00f1a entra em p\u00e2nico. Quando o showrunner de “Yellowstone”, Taylor Sheridan, a procurou para estrelar sua s\u00e9rie “Opera\u00e7\u00e3o Lioness”, ela recusou at\u00e9 reunir coragem para pedir mais tempo para memorizar seus roteiros verborr\u00e1gicos. Por que ela hesitou em simplesmente pedir o que precisava? “Eu simplesmente n\u00e3o achava que era boa”, disse ela, dando de ombros. “Sempre me senti negligenciada, mas negligenciada no sentido de ‘bem, se estou sendo negligenciada, eu mere\u00e7o’.”Agora que chegou aos 40 e poucos anos, Salda\u00f1a tem olhado claramente para os altos, baixos e compromissos que a impulsionaram at\u00e9 este ponto. Por mais desgastante que sua ind\u00fastria possa ser, ela sabe que \u00e0s vezes foi ela mesma quem se segurou. Ela espera que, ap\u00f3s “Emilia P\u00e9rez”, isso finalmente mude. “Sou minha melhor aliada e minha pior inimiga”, disse-me. “Sou geminiana, ent\u00e3o acho que h\u00e1 duas de mim.” Em 2022, logo ap\u00f3s terminar de filmar o terceiro filme de “Guardi\u00f5es da Gal\u00e1xia”, Audiard pediu para se encontrar com ela em uma chamada de v\u00eddeo para discutir o papel de Rita em “Emilia P\u00e9rez”. Ela h\u00e1 muito tempo era f\u00e3 do diretor franc\u00eas, mais conhecido por dramas intensos de personagens como “O Profeta” e “Ferrugem e Osso”. Ainda assim, ela tinha certeza de que n\u00e3o tinha chance de conseguir o papel. Afinal, por que Audiard a escolheria? Rita foi escrita como uma mulher mexicana na casa dos 20 anos e exigiria extensos n\u00fameros de canto \u2014no papel, ela era completamente errada para o papel. No passado, Salda\u00f1a se sabotou durante audi\u00e7\u00f5es importantes porque estava muito ansiosa de que perderia o papel, e ela podia sentir esse mesmo medo se aproximando. Ela queria desistir da reuni\u00e3o. Seu marido, o cineasta Marco Perego-Salda\u00f1a, a incentivou a n\u00e3o faz\u00ea-lo. “Voc\u00ea n\u00e3o quer trabalhar com Jacques Audiard?” ele perguntou. “Seria um sonho”, disse ela. “Ent\u00e3o sonhe”, ele lhe disse. No final, Salda\u00f1a participou da reuni\u00e3o e, mesmo que um ataque de p\u00e2nico come\u00e7asse a domin\u00e1-la durante a chamada de v\u00eddeo \u2014a voz em sua cabe\u00e7a continuava insistindo: “Eles n\u00e3o gostam de mim”\u2014, uma pergunta levou a outra, cada hist\u00f3ria levou a outra anedota ,e antes que percebesse, uma hora e meia havia se passado. De alguma forma, ela at\u00e9 reuniu coragem para cantar. No final da reuni\u00e3o, quando Salda\u00f1a fechou o laptop, pensou consigo mesma: “Isso foi \u00f3timo”. E ela n\u00e3o \u00e9 do tipo que se permite pensar isso t\u00e3o facilmente. Audiard estava disposto a reescrever o papel para se adequar a Salda\u00f1a, mas queria filmar o filme em setembro de 2022, quando ela deveria come\u00e7ar a filmar a primeira temporada de “Opera\u00e7\u00e3o Lioness”. Essa obriga\u00e7\u00e3o, al\u00e9m de uma extensa turn\u00ea de imprensa global para “Avatar: O Caminho da \u00c1gua”, significava que ela n\u00e3o poderia assumir um novo projeto importante at\u00e9 meados de 2023. Salda\u00f1a achou que esse era o fim de seu sonho: “Pensei: ‘N\u00e3o vai rolar, mas pelo menos cheguei at\u00e9 aqui. Ele sabe quem eu sou e um dia, se eu estiver em Paris, vou pedir um caf\u00e9 a ele e ele dir\u00e1 n\u00e3o, e tudo bem.'” Em vez disso, Audiard decidiu esperar por ela, adiando a produ\u00e7\u00e3o por um ano inteiro. “Mesmo agora, tenho dificuldade em entender isso”, disse ela. Tudo o que sabia era que, de alguma forma, havia convencido Audiard a depositar sua f\u00e9 nela. E, se ele acreditava nela, ela deveria come\u00e7ar a acreditar em si mesma.Quando “Emilia P\u00e9rez” estreou no Festival de Cinema de Cannes em maio, levou tempo para Salda\u00f1a assimilar todo o reconhecimento. Seus poucos dias no sul da Fran\u00e7a pareceram uma experi\u00eancia fora do corpo e foi dif\u00edcil perceber que grande parte dos aplausos era destinada a ela. Embora ela n\u00e3o pudesse comparecer \u00e0 cerim\u00f4nia de premia\u00e7\u00e3o do festival pessoalmente, pois j\u00e1 havia voado de volta para o Texas para filmar “Opera\u00e7\u00e3o Lioness”, ela estava assistindo \u00e0 transmiss\u00e3o ao vivo online com sua fam\u00edlia quando foi anunciado que o pr\u00eamio de melhor atriz seria compartilhado por Salda\u00f1a e suas co-estrelas Gascon, Selena Gomez e Adriana Paz. Essa era uma perspectiva que ela n\u00e3o ousava imaginar, e isso a fez chorar: “Eu n\u00e3o disse palavras, apenas emiti sons”. Agora, enquanto sua fam\u00edlia se muda para uma nova casa, Salda\u00f1a tem ponderado onde colocar seu trof\u00e9u de Cannes. Inicialmente, ela se sentiu envergonhada de exibi-lo, at\u00e9 que seu marido insistiu que ela havia trabalhado por muito tempo e arduamente para continuar menosprezando suas conquistas. “Demorei muito para admitir que sim, eu quero a aprova\u00e7\u00e3o das pessoas”, ela disse. “Um artista n\u00e3o faz arte apenas para escond\u00ea-la no arm\u00e1rio. Voc\u00ea faz arte para compartilhar esses elogios e, mesmo que diga que n\u00e3o os quer, vamos l\u00e1, me jogue um elogio de vez em quando. \u00c9 aquela coisa de sempre perguntar ao universo, eu importo? O que estou fazendo importa?” At\u00e9 mesmo a estrela mais realizada pode ser atormentada por d\u00favidas em um lugar como Hollywood, onde o sucesso pode parecer uma miragem e um letreiro de 45 p\u00e9s s\u00f3 tem tanto poder quanto voc\u00ea est\u00e1 disposto a lhe dar. Mas as ansiedades de Salda\u00f1a foram moldadas muito antes de ela pisar em um est\u00fadio de grava\u00e7\u00e3o. “Sempre fui competitiva comigo mesma e nunca, nunca, nunca mais quero me sentir irrelevante”, ela disse. “Estava agindo de forma boba por tanto tempo, desde os 9 anos.” Foi nessa idade que seu pai morreu em um acidente de carro, e Salda\u00f1a e suas irm\u00e3s, que cresceram no Queens, foram enviadas para a Rep\u00fablica Dominicana por v\u00e1rios anos para serem criadas pela fam\u00edlia dele. “O luto bateu \u00e0 nossa porta muito cedo em nossas vidas e lan\u00e7ou uma grande sombra”, ela disse.Salda\u00f1a nunca encontrou seu lugar em seu novo lar. Todo o dinheiro que seu pai havia deixado foi destinado \u00e0 educa\u00e7\u00e3o privada das filhas, mas ela foi ostracizada por colegas ricos que a intimidavam por ser muito pobre, muito desajeitada e de pele muito escura. Embora suas irm\u00e3s tentassem proteg\u00ea-la, pouco podiam fazer, e Salda\u00f1a canalizou toda sua energia frustrada para as aulas de bal\u00e9, determinada a dominar algo que n\u00e3o lhe pudesse ser negado. Aos 13 anos, ela estava em uma liga\u00e7\u00e3o com v\u00e1rias outras meninas quando surgiu o t\u00f3pico: o que voc\u00ea vai ser quando crescer? Uma menina disse que queria ser arquiteta, enquanto outra esperava ser engenheira. E ent\u00e3o perguntaram a Salda\u00f1a, o que foi uma surpresa: ela estava acostumada a ser ignorada na conversa, tratada como uma ningu\u00e9m. Ela disse que seria atriz. As outras meninas n\u00e3o acreditaram: atriz? Quem gostaria de ver algu\u00e9m como voc\u00ea fazendo algo assim? “Aquela liga\u00e7\u00e3o foi meu mundo”, disse Salda\u00f1a. “Quando desliguei, pensei: ‘Vou ser a mais bonita, a mais magra, a mais brilhante, a mais \u00e1gil da cidade’, e isso a qualquer custo. N\u00e3o importava se eu tivesse que pular aquela refei\u00e7\u00e3o e dan\u00e7ar aquelas seis horas extras e ensaiar uma \u00faltima vez: eu seria relevante.” A motiva\u00e7\u00e3o pode vir de qualquer lugar, e a ambi\u00e7\u00e3o de ter sucesso pode ser extra\u00edda de fontes que a maioria dos artistas n\u00e3o gostaria de admitir. Mas, no in\u00edcio dos 30 anos, quando Salda\u00f1a alcan\u00e7ou um n\u00edvel de sucesso de bilheteria que muitos atores invejariam, ela finalmente percebeu que sua busca incessante havia cobrado seu pre\u00e7o. “Voc\u00ea diz: ‘Estou cansada, estou com fome, estou triste e estou sozinha'”, ela disse. “‘N\u00e3o quero ser a \u00fanica assim. Quero comer um hamb\u00farguer, quero dormir e quero pedir ajuda se estiver me sentindo triste.'” Foi ent\u00e3o que come\u00e7ou a busca por realmente tentar aproveitar sua vida. Em 2013, ela conheceu Perego-Salda\u00f1a durante um voo para Nova York; eles se casaram tr\u00eas meses depois e agora t\u00eam tr\u00eas filhos. “Eu n\u00e3o queria dedicar todo o meu tempo e minha juventude e minha felicidade apenas a esta cidade, a esta ind\u00fastria”, ela disse. “Quanto mais velha fico, n\u00e3o sei se \u00e9 a perimenopausa, mas voc\u00ea se importa muito menos com coisas que eram t\u00e3o importantes para voc\u00ea e que s\u00e3o t\u00e3o arbitr\u00e1rias.” E ent\u00e3o h\u00e1 as pequenas coisas que eram mais importantes do que voc\u00ea jamais se permitiu perceber. O sobrenome de Salda\u00f1a \u00e9 escrito com um til sobre o n, mas ela foi creditada sem ele na maior parte de sua carreira. \u00c0 medida que ascendia ao estrelato, seu nome foi adaptado e pronunciado incorretamente \u2014”sal-da-na” em vez do correto “sal-dan-ya”\u2014 e s\u00f3 recentemente, em projetos como “Emilia P\u00e9rez”, ela garantiu que fosse creditada corretamente. “N\u00e3o \u00e9 por arrog\u00e2ncia, mas mais porque quero compartilhar quem realmente sou”, ela disse. “Como artista, quero sempre que a oportunidade permitir, poder compartilhar mais partes de mim no meu trabalho. ‘Emilia’ foi abrangente nesse sentido, onde pude me reconectar com uma parte de mim que abandonei.” <\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"
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