Claudia Varej\u00e3o WallinDe Estocolmo para a BBC Brasil13 setembro 2014Cr\u00e9dito, ReutersLegenda da foto, Os debates entre candidatos na Su\u00e9cia transcorrem sem ataques pessoais\u201dQue tipo de sociedade queremos ser?\u201d, berra a jovem militante sueca com seu megafone em uma rua movimentada do centro de Estocolmo. Faltam dois dias para o embate final das elei\u00e7\u00f5es gerais de domingo na Su\u00e9cia, e \u00e9 feroz a disputa entre a alian\u00e7a governista de centro-direita e o bloco liderado por um confiante Partido Social-Democrata, apesar do jejum de oito anos longe do poder.Mais sedutor que acompanhar a batalha campal que se trava, por\u00e9m, \u00e9 observar o estilo sueco de se fazer campanha pol\u00edtica: nos com\u00edcios das cidades menores, candidatos chegam a emprestar microfones e alto-falantes a advers\u00e1rios.Na profus\u00e3o de debates di\u00e1rios em todo o pa\u00eds, oponentes pol\u00edticos jamais trocam ataques pessoais \u2013 o duelo \u00e9 de id\u00e9ias. Nas ruas e redes sociais, impera o respeito \u00e0 opini\u00e3o de quem pensa diferente.Em nenhum rinc\u00e3o do pa\u00eds, legendas pol\u00edticas negociam tempo de propaganda na TV \u2013 nem poderiam: na Su\u00e9cia n\u00e3o existe hor\u00e1rio eleitoral pol\u00edtico.”N\u00e3o existe, at\u00e9 porque hor\u00e1rios eleitorais na TV s\u00e3o caros \u2013 e quem paga essa conta \u00e9 o contribuinte”, diz \u00e0 BBC Brasil o estrategista-chefe da campanha social-democrata, Jan Larsson.”O que existe aqui \u00e9 um debate constante nos jornais, nos canais de TV, nas r\u00e1dios, al\u00e9m de uma grande mobiliza\u00e7\u00e3o popular que inclui a milit\u00e2ncia porta a porta, discuss\u00f5es pol\u00edticas nos clubes de esportes, e por toda parte. E naturalmente, as m\u00eddias sociais crescem em import\u00e2ncia. Fazer campanha pol\u00edtica na internet \u00e9 extremamente eficaz, e extremamente barato”, destaca Larsson.’Respeito pela democracia’No quartel-general do Partido Social Democrata na capital sueca, o movimento \u00e9 febril. O pr\u00e9dio fica na avenida central de Sveav\u00e4gen e est\u00e1 convenientemente situado \u2013 para a eventualidade de epis\u00f3dios de estresse agudo da milit\u00e2ncia \u2013 ao lado de uma loja do Systembolaget, o monop\u00f3lio estatal da venda de \u00e1lcool no pa\u00eds.Um labirinto de corredores conduz \u00e0 ampla sala do controle central da campanha, e Jan Larsson aponta, com movimentos r\u00e1pidos das m\u00e3os: “naquele canto trabalha a equipe respons\u00e1vel pelas pol\u00edticas de educa\u00e7\u00e3o, ao lado est\u00e1 o time que trabalha com a quest\u00e3o do emprego” e assim por diante.Imensos gr\u00e1ficos decoram todas as paredes. A sala est\u00e1 repleta. Cerca de cem pessoas integram o c\u00e9rebro da campanha, mas a ordem e o sil\u00eancio imperam no lugar. \u00c9 aqui que se engendram os estratagemas e propostas para chegar ao poder. Ataques pessoais a advers\u00e1rios est\u00e3o fora da agenda.Cr\u00e9dito, Partido Social DemocrataLegenda da foto, ‘Campanha pol\u00edticas na Su\u00e9cia s\u00e3o focadas em projetos concretos de governo’, diz Jan Larsson”Campanhas pol\u00edticas na Su\u00e9cia s\u00e3o mais focadas em projetos concretos de governo, em compara\u00e7\u00e3o com outros pa\u00edses onde o foco est\u00e1 em campanhas negativas e agressivas, como por exemplo comprar espa\u00e7o na TV apenas para dizer como os seus advers\u00e1rios s\u00e3o ruins”, diz Larsson.”Penso que temos na Su\u00e9cia um respeito comum pela democracia, que espero que possamos manter. Todos os partidos pol\u00edticos lutam pelo poder, mas mantendo o respeito m\u00fatuo”, acrescenta ele.Campanha ‘compartilhada’Pule WhatsApp e continue lendoNo WhatsAppAgora voc\u00ea pode receber as not\u00edcias da BBC News Brasil no seu celularEntre no canal!Fim do WhatsAppPergunto a Larsson se \u00e9 mesmo verdade que, nas cidades do interior sueco, membros de partidos advers\u00e1rios chegam a emprestar equipamentos de campanha uns aos outros.”Isso acontece a n\u00edvel local, onde os recursos de campanha s\u00e3o mais limitados. At\u00e9 porque n\u00e3o damos import\u00e2ncia a coisas idiotas, como se preocupar em n\u00e3o emprestar microfones ou alto-falantes a um oponente”, enfatiza ele.”N\u00e3o \u00e9 que todos os pol\u00edticos suecos sejam fantasticamente bons, mas principalmente porque os eleitores suecos respeitam os pol\u00edticos que cooperam e colaboram. Ent\u00e3o o pol\u00edtico sabe que, quando empresta seu alto-falante para o candidato advers\u00e1rio, isso \u00e9 visto como uma coisa positiva pelo eleitorado. No n\u00edvel da pol\u00edtica nacional, no entanto, esse tipo de necessidade de emprestar equipamentos n\u00e3o existe”, ele completa.No n\u00edvel nacional, a coopera\u00e7\u00e3o entre as siglas se d\u00e1 em quest\u00f5es como a calculada limita\u00e7\u00e3o do reduzido n\u00famero de propaganda eleitoral nas ruas do pa\u00eds. Outdoors s\u00e3o proibidos.”Normalmente, os partidos acertam qual o n\u00famero de posters que podem ser colocados e tamb\u00e9m o hor\u00e1rio. Todos concordam que ningu\u00e9m colocar\u00e1 os posters antes da meia-noite de uma sexta-feira, por exemplo. E s\u00e3o os militantes dos movimentos jovens dos partidos que cumprem esta tarefa, de estar de p\u00e9 \u00e0 meia-noite para conseguir os melhores locais para pendurar os cartazes”, diz o chefe de campanha.Mas h\u00e1 um elemento de respeito na empreitada, observa Larsson:”Ningu\u00e9m simplesmente toma todos os melhores locais dispon\u00edveis. E muitas vezes um militante retira alguns de seus cartazes para dar lugar aos do advers\u00e1rio. Normalmente, ningu\u00e9m briga por causa disso. \u00c9 preciso entender que o objetivo da propaganda \u00e9 aumentar a visibilidade das elei\u00e7\u00f5es, mas n\u00e3o s\u00e3o nada assim t\u00e3o fundamental. E, por isso, n\u00e3o faz sentido brigar por causa disso.”Cr\u00e9dito, Dagens NyheterLegenda da foto, P\u00f4ster de candidato com os \u00f3culos cor-de-rosa colocados na foto pelo Partido FeministaAs regras s\u00e3o rigorosas: todos os p\u00f4steres eleitorais devem ser retirados das ruas num prazo m\u00e1ximo de dois dias ap\u00f3s a vota\u00e7\u00e3o.”E os pol\u00edticos sabem que se deixarem os cartazes pendurados depois do prazo, sujando a paisagem da cidade, v\u00e3o ser punidos pelos eleitores nas pr\u00f3ximas elei\u00e7\u00f5es”, diz Larsson.Nessa temporada eleitoral, alguns candidatos descontentes levantaram a voz na semana passada. Isso porque militantes do Partido Feminista sueco, em nome da sua causa, aproveitaram a calada da noite para colocar adesivos de \u00f3culos cor-de-rosa nos rostos de todos os l\u00edderes partid\u00e1rios estampados nos cartazes advers\u00e1rios.Debate de ideiasMas, no geral, as campanhas pol\u00edticas na Su\u00e9cia se definem a partir de um tradicional trip\u00e9 de coopera\u00e7\u00e3o, consenso e bom-senso, sustentado a partir de um robusto debate de id\u00e9ias e propostas concretas.Em todos os jornais, r\u00e1dios, sites de not\u00edcias, canais de TV e redes sociais, o debate de id\u00e9ias \u00e9 di\u00e1rio e intenso. Jornais abrem espa\u00e7o em suas p\u00e1ginas de opini\u00e3o para debater temas diversos da campanha e convidam pol\u00edticos dos diferentes partidos a expressar suas posi\u00e7\u00f5es e propostas em dias alternados.Nas TVs p\u00fablicas e comerciais, os debates se produzem em programas de uma hora de dura\u00e7\u00e3o, seguidos por an\u00e1lises com pain\u00e9is de cientistas pol\u00edticos e pol\u00edticos dos diferentes partidos. Nos telejornais, duplas de candidatos advers\u00e1rios se enfrentam em discuss\u00f5es di\u00e1rias de propostas. Nas r\u00e1dios, a cena se repete.Em programas de culin\u00e1ria, candidatos preparam jantares para advers\u00e1rios em suas casas. E programas dedicados a \u00e1reas como cultura e sa\u00fade, nesses tempos de elei\u00e7\u00e3o, tamb\u00e9m se transformam em arenas de debates de candidatos sobre temas espec\u00edficos, tanto nas r\u00e1dios como nas TVs.Cada pol\u00edtico sueco sabe que tem que fundamentar cada proposta e explicar muito bem de onde pensa em tirar o dinheiro para financiar e cumprir a promessa \u2013 \u00e9 a\u00ed que os verdadeiros duelos se travam com ferocidade, mas com respeito.”Pol\u00edticos que s\u00e3o duros demais com seus advers\u00e1rios se arriscam a perder o voto do eleitor”, disse no jornal Svenska Dagbladet a especialista em ret\u00f3rica Lena Lid Falkman, que integra o painel de an\u00e1lises pol\u00edticas do di\u00e1rio.”Ataques pessoais contra advers\u00e1rios pol\u00edticos e campanhas negativas n\u00e3o d\u00e3o certo na Su\u00e9cia. A campanha tem que ser limpa, e n\u00e3o h\u00e1 espa\u00e7o para ofensas indecorosas. Se um pol\u00edtico quer ser cruel contra um advers\u00e1rio, ele tem que fazer isso com humor”, pontuou Lena.Cr\u00e9dito, AFPLegenda da foto, A afixa\u00e7\u00e3o de propaganda eleitoral em locais p\u00fablicos obedece a regras r\u00edgidasO rep\u00f3rter perguntou a Lena o porqu\u00ea de n\u00e3o se ver na Su\u00e9cia, como ocorre em outros pa\u00edses, murros e socos entre parlamentares.”Temos na Su\u00e9cia uma cultura de consenso e de ouvir quem tem opini\u00f5es divergentes. Tamb\u00e9m somos um pa\u00eds pac\u00edfico e n\u00e3o nos parecem existir coisas no debate pol\u00edtico suficientemente importantes para nos engalfinharmos em sua defesa. Os partidos pol\u00edticos tamb\u00e9m cooperam de maneira bem mais pr\u00f3xima para solucionar os problemas do pa\u00eds”, destacou ela.Mas Lena admite que a entrada no Parlamento dos Democratas da Su\u00e9cia (Sverigedemokraterna, partido de extrema-direita) tornou a situa\u00e7\u00e3o mais dram\u00e1tica:”O debate pol\u00edtico ficou mais acirrado. E, de certa forma, \u00e9 mais tolerado ser um tanto duro contra os pol\u00edticos da extrema-direita.”Propaganda Pol\u00edticaAt\u00e9 o ano passado, campanhas publicit\u00e1rias de partidos pol\u00edticos na TV eram proibidas na Su\u00e9cia. Este ano, pela primeira vez, faz-se uma experi\u00eancia: no canal 4 da TV comercial, o eleitorado assiste a breves comerciais pol\u00edticos de cerca de 40 segundos de dura\u00e7\u00e3o, veiculados entre an\u00fancios de margarina e barras de chocolate.”Produzir comerciais mais longos seria caro demais, n\u00e3o ter\u00edamos dinheiro”, diz uma das assistentes de Jan Larsson, no comando central da campanha social-democrata.Na Su\u00e9cia, a principal fonte de arrecada\u00e7\u00e3o de fundos dos partidos pol\u00edticos \u00e9 o financiamento p\u00fablico, que corresponde a um valor entre 70% e 80% do total arrecadado pelas agremia\u00e7\u00f5es.”Exatamente pelo fato de as campanhas publicit\u00e1rias serem uma ferramenta t\u00e3o cara e t\u00e3o poderosa, \u00e9 preciso ser cuidadoso e n\u00e3o exagerar na sua utiliza\u00e7\u00e3o”, diz Larsson.”E \u00e9 importante ter sob controle as contribui\u00e7\u00f5es de campanha para os partidos, a fim de evitar a sensa\u00e7\u00e3o que se tem no sistema americano, por exemplo, de que a Associa\u00e7\u00e3o Nacional de Rifles financia as siglas e as campanhas publicit\u00e1rias para influenciar a agenda pol\u00edtica.”Sobre as campanhas milion\u00e1rias que se produzem no hor\u00e1rio eleitoral pol\u00edtico do Brasil, Jan Larsson diz que \u00e9 preciso ter cautela:”Seria um absurdo da minha parte expressar opini\u00f5es pessoais sobre a democracia brasileira, mas naturalmente \u00e9 preciso ter-se muito cuidado em permitir que o dinheiro controle a informa\u00e7\u00e3o. Especialmente quando n\u00e3o se tem um sistema r\u00edgido para controlar quem financia os partidos pol\u00edticos. Se a distribui\u00e7\u00e3o de recursos para os partidos \u00e9 justa, ent\u00e3o todos t\u00eam as mesmas oportunidades. Mas quando voc\u00ea permite que grandes empresas e organiza\u00e7\u00f5es controlem o financiamento dos partidos, p\u00f5e-se em risco uma coisa extremamente fundamental, que se chama democracia”, diz Larsson.”O que deve vencer uma elei\u00e7\u00e3o \u00e9 o melhor argumento, e n\u00e3o a carteira mais gorda”, opinia o estrategista.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"
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