Descri\u00e7\u00e3o de chap\u00e9u Nos anos 1950, Vinicius de Moraes provocou grande celeuma quando afirmou que S\u00e3o Paulo era o t\u00famulo samba. Na verdade, o Poetinha contou somente tempos depois que se referia n\u00e3o \u00e0 produ\u00e7\u00e3o musical dos sambistas da Pauliceia, dos quais era amigo, mas falava sobre a recatada noite paulistana, quando o assunto era samba. Um grande amigo, o jornalista e cozinheiro Adriano Pessini, sempre brincou comigo dizendo que S\u00e3o Paulo era, na verdade, o t\u00famulo do galeto, iguaria t\u00edpica dos cariocas. Quem j\u00e1 curtiu as esquinas do Rio de Janeiro sabe que, l\u00e1, as casas de galeto s\u00e3o uma coisa s\u00e9ria. T\u00e3o importantes na vida dos cariocas como o pr\u00f3prio samba. Verdadeira institui\u00e7\u00e3o cultural, est\u00e3o espalhadas por toda a \u201cCidade Maravilhosa\u201d. Chamadas de \u201cbunda de fora\u201d, as galeterias costumeiramente t\u00eam banquetas fixas junto do balc\u00e3o, que circundam o estabelecimento. Assim, os clientes ficam de costas para rua, com a bunda, literalmente, de fora. \u00c9 bem verdade que n\u00e3o h\u00e1 em S\u00e3o Paulo a cultura das galeterias, mas posso afirmar que existe galeto em SP! Um lugar para matar a vontade do \u201cway of life\u201d carioca \u00e9 o simp\u00e1tico Galeto Lous\u00e3. Estabelecido desde 1972 na hom\u00f4nima galeria Lous\u00e3, uma discreta e silenciosa passagem que liga os conturbados cal\u00e7ad\u00f5es das ruas Dom Jos\u00e9 de Barros e Bar\u00e3o de Itapetininga, a galeteria foi criada por um carioca aos moldes do Rio: banquetas junto ao balc\u00e3o, poucas mesas, galetos e outros cortes na brasa e ar despojado. A clientela \u00e9 fixa. Ao meio-dia as mesas lotam num piscar de olhos. S\u00e3o gentes dos escrit\u00f3rios da regi\u00e3o, funcion\u00e1rios p\u00fablicos e do mercado financeiro. Contraditoriamente, o lugar \u00e9 calmo e tranquilo, e isso faz seu charme. Naquele zum-zum-zum, todos parecem saber os nomes uns dos outros. O cheiro dos galetos, que vem da churrasqueira pilotada por Nilvan Bessa, d\u00e1 \u00e1gua na boca. Bessa trabalha no Lous\u00e3 h\u00e1 25 anos. Ele \u00e9 o respons\u00e1vel por manter inalterados o sabor e a qualidade dos pratos. Mas, para tamanha responsa, ele teve um bom professor. Seu pai, Oswaldo Bessa, j\u00e1 aposentado, comandou a cozinha local por 40 anos e ensinou todos os segredos ao filho. Atualmente, a casa \u00e9 comandada pela empres\u00e1ria Cleonice Marques Oliveira, a Cl\u00e9o, que faz quest\u00e3o de frisar que mant\u00e9m toda a tradi\u00e7\u00e3o da cozinha do Lous\u00e3. \u201cN\u00e3o mudamos nada na cozinha. Al\u00e9m disso, n\u00e3o usamos nada artificial, nada comprado pronto. Tudo \u00e9 feito aqui\u201d, conta Cl\u00e9o com orgulho. Se voc\u00ea \u00e9 daqueles que s\u00f3 come salada de maionese na casa da m\u00e3e ou da av\u00f3, no Lous\u00e3 voc\u00ea pode quebrar esse paradigma. Eles a fazem apenas com maionese, batata e salsinha, e est\u00e1 sempre leve e fresquinha. \u00c9 a melhor pedida para a vers\u00e3o do galeto com acompanhamentos (R$ 38). A vers\u00e3o tradicional (R$ 32) vem apenas com vinagrete e farofa. A depender da fome ou est\u00f4mago, o galeto serve at\u00e9 duas pessoas. Apesar de fazer sucesso tamb\u00e9m com saladas, chuleta e feijoada, sem d\u00favida o carro-chefe da casa \u00e9 o galeto carioca. O Lous\u00e3 vende, em m\u00e9dia, algo entre 55 a 60 galetos por dia. Para garantir um sabor tenro e n\u00e3o deix\u00e1-los secos, o churrasqueiro prepara os assados sobre a brasa lentamente, at\u00e9 dourar a pele do frango. De tempero suave, antes de chegar aos pratos dos comensais os galetos s\u00e3o gentilmente cortados na tesoura por Nilvan. O galeto do Lous\u00e3 \u00e9 um sinal de que, neste \u201clabirinto m\u00edstico, onde os grafites gritam\u201d, n\u00e3o sejamos mais o t\u00famulo samba, e podemos qui\u00e7\u00e1 dizer que ainda existe amor em SP. Agora Bom de Garfo Otavio Valle, 48, \u00e9 formado pela Unesp (Universidade Estadual Paulista) e p\u00f3s-graduado em fotografia pelo Senac, mas a vida de jornalista o fez especialista em “botecologia”, pela universidade “Bares da Vida”. <\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"
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