Na segunda-feira (26), Hamily caminhou até uma tenda com acesso à internet onde se encontrou com o amigo Talal Murad. O local, conhecido como “sala de internet”, é usado por palestinos que precisaram abandonar suas casas para se conectar ao mundo exterior. Durante a conversa entre os amigos, veio um clarão. Uma explosão de calor branco que jogou terra para todo lado. Murad disse que sentiu dor no pescoço e logo viu Halimy com a cabeça sangrando. Um carro que estava próximo, em uma estrada, estava pegando fogo. Aparentemente, o veículo foi alvo de um ataque aéreo israelense. Demorou 10 minutos para uma ambulância chegar. Horas depois, os médicos declararam Halimy morto. “Ele representava uma mensagem. Ele representava esperança e força”, disse Murad, que ainda se recupera dos ferimentos por estilhaços. Mohamed (Medo) Halimy (à esquerda) com seus amigos, os irmãos gêmeos Mohammed Hirez (ao centro) e Helmi Hirez (à direita) em uma praia em Gaza. — Foto: Helmi Hirez via AP Israel não confirmou a autoria do bombardeio que matou Halimy. Homenagens ao tiktoker continuaram chegando na sexta-feira (30), vindas de amigos de toda parte do mundo, incluindo dos Estados Unidos. Em 2021, Halimy fez um intercâmbio no Texas, patrocinado pelo Departamento de Estado norte-americano. “Ele era a vida da festa, humor, bondade e inteligência. Todas coisas que nunca podem ser esquecidas”, disse Heba al-Saidi, coordenadora de ex-alunos do Programa de Intercâmbio e Estudo Kennedy-Lugar. “Ele estava destinado à grandeza, mas foi levado muito cedo.” A morte do jovem também desencadeou uma onda de luto nas redes sociais, onde seguidores de Halimy expressaram choque e tristeza — como se também tivessem perdido um amigo próximo. Não foi possível carregar o conteúdo Seu dispositivo possui uma resolução não suportada. A operação militar de Israel contra o grupo terrorista Hamas na Faixa de Gaza matou mais de 40.000 palestinos, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas. O levantamento não faz distinção entre civis e militantes. A guerra em Gaza gerou uma catástrofe humanitária no território. O conflito também transformou legiões de adolescentes comuns — que não têm nada para fazer todos os dias a não ser tentar sobreviver — em correspondentes de guerra para a era das redes sociais. “Trabalhamos juntos, foi uma forma de resistência que espero continuar”, disse Murad. Ele colaborou com Halimy na “Experiência Gazita”, no Instagram. A conta respondia perguntas de seguidores do mundo todo que tentavam entender como era a vida na Faixa de Gaza. Halimy lançou sua própria conta no TikTok após se refugiar com os pais e cinco irmãos. Eles foram para Muwasi, uma área costeira do sul de Gaza que Israel designou como zona segura humanitária. Desencadeada pelo ataque surpresa do Hamas a Israel em 7 de outubro, que matou 1.200 pessoas e resultou em cerca de 250 pessoas sequestradas, a guerra produziu uma torrente de imagens dolorosas: edifícios bombardeados, corpos contorcidos, corredores hospitalares caóticos. Mas o conteúdo de Halimy “veio como uma surpresa”, disse seu amigo, Helmi Hirez, de 19 anos. Voltando a câmera para os detalhes íntimos da própria vida em Gaza, ele alcançou espectadores de longe e de perto, revelando um tédio enlouquecedor que acaba ficando fora da cobertura jornalística sobre a guerra. “Se você se pergunta como é viver em uma tenda, venha comigo para mostrar como passo o meu dia”, diz Halimy em seu primeiro de muitos diários de “vida na tenda”. Ele filmou a si mesmo passando o dia: esperando inquieto em longas filas por água potável e tomando banho com um pote e um balde — “não há xampu ou sabão, claro”. Halimy também gravou vídeos procurando ingredientes para fazer uma “baba ganoush” surpreendentemente saborosa, que é uma pasta de berinjela defumada típica do Oriente Médio — “Mama mia!” ele se maravilhou com a criação. O jovem também se retratou ficando muito, muito entediado: “Então voltei para a tenda e não fiz nada”. Alguns de seus vídeos viralizaram, acumulando mais de 2 milhões de visualizações no TikTok. Hamily conquistou mais de 200 mil seguidores na rede social. Mesmo quando relatava tragédias ou se preocupava com os bombardeios de Israel, os amigos de Halimy disseram que ele encontrava alívio canalizando o luto e ansiedade em humor seco. “Muito irritante,” disse revirando os olhos quando o zumbido de um drone israelense interrompeu um de seus vídeos de receitas no TikTok. “Como você pode ver, o transporte aqui não é cinco estrelas,” disse enquanto estava espremido entre homens em uma caminhonete a caminho da cidade de Deir al-Balah. “Continuamos a jogar, de qualquer maneira,” afirmou jogando Monopoly com os amigos, enquanto Israel conduzia um ataque. “De qualquer maneira, eu perdi.” Em seu último vídeo, postado horas antes de ser morto, Halimy aparece rabiscando um caderno. “Comecei os designs para meu novo projeto secreto,” disse da tenda que foi atingida por um bombardeio, no mesmo tom que sempre usava. Uma parte brincalhona, uma parte séria. VÍDEOS: mais assistidos do g1