Até onde vai a capacidade da meteorologia alertar sobre eventos climáticos extremos, como as chuvas que levaram às enchentes no Rio Grande do Sul? Além da previsão do tempo, conhecida por trazer projeções para até 72h, meteorologistas também podem contar com a “tendência do tempo”, que, embora menos precisa, ajuda a “acender o alerta” para condições adversas. O g1 conversou com Bruno Bainy, especialista do Centro de Pesquisas Meteorológicas da Unicamp(Cepagri), que explicou a diferença entre os dois conceitos e por que a análise de dados para intervalos maiores de tempo requer cautela. Tendência do tempo 🔎 O que é? Em resumo, a tendência do tempo traz uma análise das condições climáticas em um intervalo de até 15 dias com o objetivo de identificar condições atípicas que merecem atenção, como chuva intensa e quedas bruscas de temperatura. A tendência é calculada por meio de softwares que resolvem as “equações governantes da atmosfera”, segundo Bainy. Esses dados permitem que tanto moradores quanto o poder público se preparem para eventos intensos, como uma onda de frio que se aproxima, por exemplo. “Quando a gente identifica uma situação potencialmente adversa para a sociedade, para além dos três dias que a gente costuma fazer a previsão, reportamos para começar a conscientizar a população e tomadores de decisão desse fenômeno meteorológico que está sendo indicado”, explica. 🤔 Por que é preciso cautela? Quanto maior o intervalo de tempo analisado, menor é o grau de previsibilidade, explica o meteorologista. Isso porque a capacidade de avaliação dos dados de softwares depende – e muito – do cenário atual da atmosfera. “Quando o meteorologista está fazendo a previsão para até três dias, ele tem em mente as condições atuais da atmosfera e pondera as informações do modelo com base no que vem ocorrendo nas últimas horas. Para além de três dias, o meteorologista depende muito mais, quase que exclusivamente, dos dados dos modelos, que têm suas limitações”, detalha Bainy. A tendência do tempo é, portanto, uma informação genérica que aponta os riscos potenciais em um determinado intervalo de tempo, mas o detalhamento dos fenômenos acontece somente nos dias que antecedem o evento. Imagens de satélite mostram antes e depois de maior enchente da história no RS 🌧️ Atualmente, como a tendência do tempo é utilizada? Bainy explica que as previsões de longo prazo podem ser acessadas por qualquer meteorologista, mas não são comumente utilizadas justamente por conta da imprecisão. “Recentemente, algumas empresas privadas de meteorologia repercutiram uma onda de frio no Norte do país com base em projeções de longo prazo. Isso não se concretizou. […] Na atmosfera, os fenômenos acontecem de forma não linear, ou seja, isso aumenta as incertezas”, destaca. O meteorologista destaca que a tendência do tempo tem função qualitativa. “Ou seja, descreve o que pode ocorrer, frio, chuva, especialmente se forem eventos que possam impactar mais a população”. 👉 Em resumo, o Cepagri utiliza projeções para períodos de até 15 dias para: indicar, sem detalhamento, quando uma condição persistente deve mudar, como o fim de uma onda de calor;identificar possíveis quedas bruscas na temperatura, especialmente quando coincidem com valores de alerta da Defesa Civil; identificar eventos potenciais de chuva intensa e/ou volumosa em uma área geográfica grande. ☂️ E a previsão? Por outro lado, a previsão do tempo analisa períodos de até 72h e consegue trazer um nível maior de detalhamento sobre os processos que estão acontecendo na atmosfera. Além disso, é atualizada pelo menos uma vez por dia, trazendo os dados mais recentes e com maior precisão. “Fazemos primeiro um diagnóstico, que é com base em imagens de satélite, dados de situação meteorológica, temos medições e uma caracterização da situação atual da atmosfera das últimas horas. Isso nos ajuda a entender o que está acontecendo e a fazer uma projeção para as próximas horas, para aquele dia”, diz o meteorologista. Enchentes no Rio Grande do Sul: bairro de São José, na cidade de Lajeado, em 16 de maio de 2024 — Foto: Nelson Almeida/AFP Fluxo de alerta No Brasil, situações de risco de desastre são acompanhadas pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), em parceria com órgãos como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). 🚨 Segundo o Cemaden, todo alerta emitido segue o fluxo abaixo: as informações sobre o possível impacto são inicialmente repassadas pela comunidade, por universidades ou instituições como Inpe, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e Serviço Geológico do Brasil (SGB);ao receber os dados, o Cemaden entra em contato com o Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cenad), responsável por articular ações preventivas de proteção civil;depois, os órgãos da Defesa Civil nos níveis estadual e municipal são avisados para mobilização e resposta. 📍 E em Campinas? Além do monitoramento feito pelo Cemaden e Cenad, os setores de risco na metrópole também são acompanhados 24 horas pelo Centro de Operações de Emergência do Governo do Estado, segundo a prefeitura. Alertas de umidade relativa do ar, chuva forte, ventaria e onda de calor, boletins de alta e baixa temperatura e previsão do tempo podem ser acessados pela população no site Campinas Resiliente, atualizado pelo Setor de Monitoramento e Alerta da Defesa Civil;Além disso, a população pode se cadastrar para receber alertas, informações de risco e orientações de autoproteção por SMS, enviando uma mensagem com o CEP do local para o número 40199. Tragédia no RS A maior enchente da história do Rio Grande do Sul deixou mais de 150 mortos e 800 feridos em todo o estado, segundo informações divulgadas pela Defesa Civil. VÍDEOS: tudo sobre Campinas e região