Síndrome de Kawasaki: conheça a doença vascular que matou criança de 7 meses em Campinas

Síndrome de Kawasaki: conheça a doença vascular que matou criança de 7 meses em Campinas

Médicos ouvidos pelo g1 classificam a doença como rara. A metrópole registrou, no ano passado, aumento nos atendimentos ligados à enfermidade, ainda que os números sejam baixos – 12 em 2023 contra seis no ano anterior. Em todo o país, foram 1.429 mil atendimentos ambulatoriais e 21 óbitos pela doença em 2023 (veja os gráficos abaixo). Segundo especialistas, casos fatais são ainda mais raros, já que as chances de recuperação são altas entre as crianças diagnosticadas precocemente. ▶️ Nesta reportagem você vai ver: O que é a síndrome de Kawasaki? A síndrome dos linfonodos mucocutâneos — ou doença de Kawasaki, como é popularmente conhecida — foi descrita pela primeira vez na década de 1960 pelo médico japonês Tomisaku Kawasaki. Trata-se de uma vasculite rara, que causa uma inflamação nos vasos sanguíneos, especialmente nas artérias coronárias, responsáveis por levar o sangue para o coração. Sem tratamento adequado, pode levar a aneurismas. Professor e médico responsável pelo atendimento inicial às crianças diagnosticadas com a doença no Hospital de Clínicas da Unicamp, Ricardo Mendes explica que a doença é considerada recente e carece de informações ou exames laboratoriais para diagnóstico. ▶️ Para identificar a síndrome, os médicos observam os seguintes sintomas: febre alta há mais de cinco dias;conjuntivite sem secreção;inchaço e vermelhidão nos pés e mãos;vermelhidão no corpo, como uma alergia;rachaduras e lesões nos lábios;e aumento de um gânglio na região cervical. “Caso a criança tenha cinco dos seis sintomas, e um deles seja a febre, ela preenche o critério de Kawasaki. Mas, antes, o médico vai excluir várias outras doenças que se parecem com a Kawasaki”, explica o professor. Segundo Mendes, em casos de diagnóstico tardio, o paciente pode desenvolver aneurismas nas coronárias, além de outros quadros que podem levar ao óbito. Esse desfecho, porém, nunca foi visto pelo especialista em 30 anos de carreira. Lúcia Campos, professora e chefe de reumatologia pediátrica no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), explica que a doença geralmente acomete crianças de 1 a 5 anos, e há maior predisposição genética entre orientais. “Há predisposição genética da síndrome entre crianças orientais, como japonesas. No Brasil, há a ocorrência da doença entre crianças de outras etnias, mas acomete majoritariamente crianças amarelas”, reitera a especialista. Qual é a incidência da doença? Considerando somente Campinas, os dados da Secretaria de Estado da Saúde (SES) de São Paulo mostram que foram 29 atendimentos ambulatoriais e 24 internações pela doença entre 2021 e 2024. Os dados nacionais e estaduais mostram, também, a ocorrência de falecimentos por complicações da doença. Entre janeiro e maio de 2024, por exemplo, dados do Ministério da Saúde mostram que oito crianças morreram pela síndrome em todo país. ⚠️ Importante ressaltar que os dados de atendimento e internações não representam o número total de pessoas diagnosticadas, já que o mesmo paciente pode ter sido atendido e contabilizado mais de uma vez (tanto por ser atendido e internado, ou por dar entrada mais de uma vez). Como os casos graves acontecem? Lúcia Campos explica que uma dose de imunoglobulina humana é suficiente para que uma criança se recupere da doença. Mas, segundo a médica, existem duas formas da doença que aumentam a gravidade e o risco de surgimento de um aneurisma: a refratária e a incompleta. Refratária: quando o paciente não responde ou responde mal ao tratamento de imunoglobulina.Incompleta: quando o paciente não atende a todos os critérios de diagnóstico (sintomas e faixa etária). “Formas incompletas inferem no atraso do diagnóstico do tratamento, e determinam um pior prognóstico. E elas podem ter, por si, uma forma mais grave, que significa ser refratário ao tratamento. Seja uma situação, seja a outra, essas crianças têm maior risco de desenvolver um aneurisma”, explica. Morte em Campinas Caio Otsuka, de 7 meses, começou apresentar os primeiros sintomas de febre em 22 de abril deste ano. Ao g1, Carine Araújo, mãe do menino, relata que começaram a surgir manchas pelo corpo do bebê, principalmente nos pés e pernas, no dia seguinte. Um exame de sangue inicial apontou para um quadro de escarlatina, para o qual os médicos receitaram um antibiótico por 10 dias. Uma semana após o diagnóstico, porém, o menino foi levado ao Hospital Mário Gattinho com dores e anemia. Família de Caio Benício Araújo Otsuka denuncia — Foto: Carine Araújo Apesar de não apresentar melhora, os médicos mantiveram o diagnóstico de escarlatina. “[Uma das médicas] falou assim para mim: ‘é, mãe, alguma coisa tem estranha. As plaquetas estão altas, o leucócito está alto, mas eu não sei te dizer o que é’. E simplesmente liberou ele”, lembra Carine. No dia seguinte à liberação, ainda com febre, a criança foi levada à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Campo Grande pelo SAMU; depois, no dia 2 de maio, Caio foi transferido para o Hospital Ouro Verde, onde recebeu o diagnóstico de síndrome de Kawasaki e de dois aneurismas. O bebê permaneceu internado por nove dias e morreu em 12 de maio, no Dia das Mães, após ser transferido para o Hospital de Clínicas da Unicamp, onde faria uma cirurgia cardíaca para colocar um marca-passo. Denúncia de negligência A família de Caio abriu um boletim de ocorrência por negligência médica após a morte do menino. Isso porque, segundo a mãe, houve demora no atendimento e os médicos não solicitaram todos os exames necessários para identificar eventuais complicações da síndrome. Carine também afirma que nenhum médico cardiologista ou reumatologista examinou o filho no período em que esteve internado no Hospital Ouro Verde, mesmo após o diagnóstico de uma forma aguda da doença de Kawasaki. “Se eles tivessem falado que tentaram de tudo, mas não conseguiram salvar o meu filho, eu me conformava. Mas, não me conformo por ele passar os dez dias sem um especialista para o caso dele.[…] Dez dias foram tempo suficiente, e eu perdi o meu bem mais precioso”, lamenta. Em nota, a Rede Mário Gatti afirmou que o menino “recebeu todos os cuidados indicados e necessários ao quadro que apresentava”, mas não se manifestou em relação à falta de exames e de atendimento por um médico cardiologista durante a internação. Veja, abaixo, a nota na íntegra: “A Rede Mário Gatti de Urgência, Emergência Hospitalar informa que a criança foi atendida na Unidade Pediátrica Mário Gattinho no dia 30 de abril, realizou exames e recebeu alta com orientação compatível com o quadro que apresentava. No dia 1º de maio foi atendida na UPA Campo Grande e transferida em 2 de maio para complementação diagnóstica e seguimento ao tratamento no Complexo Hospitalar Prefeito Edivaldo Orsi (Ouro Verde). A criança permaneceu na unidade até 11 de maio quando, por necessidade de conduta especializada (cirurgia cardíaca), foi transferida para o Hospital de Clínicas da Unicamp. No período em que foi atendida nas unidades da Rede Mário Gatti, a criança recebeu todos os cuidados indicados e necessários ao quadro que apresentava”. Hospital Municipal Ouro Verde, em Campinas — Foto: Reprodução/EPTV *Estagiária sob supervisão de Arthur Menicucci e Gabriella Ramos. VÍDEOS: tudo sobre Campinas e região

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