Eles fazem parte do criativo setor de Economia Solidária e são ativos em feiras e cursos na cidade com foco em sustentabilidade e educação ambiental. Biojóias Folhas, flores e árvores inspiram a artesã e florista Marília de Sena Ferreira, de 61 anos, a produzir biojóias. O material encontrado na natureza se transforma em colares, brincos e pulseiras que dialogam com um mundo mais sustentável e ecológico. “Tudo que você colher da natureza, pegar uma folha e passar uma cola nela, já vira biojóia. Eu só colho o que cai no chão, não pode tirar da árvore”, disse . Biojóias são feitas de materiais orgânicos encontrados na natureza. Na foto colares e brincos feitos com sementes e flores colidas em São Carlos. — Foto: Amanda Rocha/g1 Marília veio de Angra dos Reis (RJ) para São Carlos para fazer um tratamento contra um agressivo câncer de mama. Em plena pandemia, desacreditada pelos médicos com diagnóstico de um ano de vida, ela começou a caminhar na UFSCar. Marília Ferreira se inspira na natureza para fazer artesanato em São Carlos. Casca da semente de escova-de-macaco virou um porta incenso nas mãos da artesã. — Foto: Amanda Rocha/g1 Foi na universidade, quando uma semente de escova-de-macaco caiu em seus pés, que ela visualizou uma biojóia. Aquela casca de semente se tornou um incensário e, a partir daí, brincos de seringueira e colares de flores brotaram. “Eu vi a semente caindo, era uma filamento dourado, lindo. Meus filhos falaram que era mato, eu via renda. Eu sou assim, penso fora da caixinha, as coisas vêm na minha cabeça, eu vou e faço. A natureza me inspira, as sementes pulam em mim e eu sou obrigada a fazer algo”, contou. Marília também faz colares de sementes de açaí. Produtos são expostos na Feira da XV de São Carlos aos domingos — Foto: Amanda Rocha/g1 O trabalho é demorado e uma peça ecológica pode levar até 10 dias para ficar pronta. A artesã está todos os domingos na Feira da Economia Solidária da Praça Dr. Christiano Altenfelder Silva (Praça da XV), a mais tradicional da cidade e principal vitrine dos artesões. Produto social Segundo a artesã Candida Santos, de 64 anos, São Carlos é referência em economia solidária, o que inspira e atrai criativos para a cidade. Ela é envolvida com movimento de artesanato sustentável e faz parte do grupo Talentos Artísticos de São Carlos (Tasca) e do Conselho Municipal de Economia Solidária. “Temos lei municipal e políticas públicas para o setor com fomento, dentro do Conselho temos um fundo que dá suporte para os empreendimentos e para a feira. Há também iniciativas na USP, UFSCar , cooperativa ambiental e banco comunitário. Mas o nosso cartão postal é a Feira da [Praça] XV”, disse. A artesã Candida Santos é envolvida com o movimento de artesanato sustentáve e faz parte do grupo Talentos Artísticos de São Carlos (Tasca). — Foto: Amanda Rocha/g1 Candida também faz um trabalho sustentável. Ela usa tecidos descartados como fio para tapetes de tricô. “Chamo esses tapetes de produto social porque não cobro o material, como ia para o lixo, só cobro pela mão de obra. Eu recebo muitas doações. O artesanato passou a ser uma fonte de renda para mim, faço crochê tradicional também e a malha veio no período da pandemia” , contou. Com o pensamento na sustentabilidade, ela já realizou projetos com o Tasca de reaproveitamento em empresas. “Devido ao logo, o Sesc não pode doar seus uniformes e nós transformamos camisetas em cachepot, porta garrafa. Até os aventais são reaproveitados em porta talheres.” A artesã contou que fora a paixão move a produção do artesanato, mas o melhor de tudo é quando alguém leva para casa uma peça que produziu. “Fazer artesanato é a minha paixão e me sinto muito bem quando alguém leva um pedacinho do meu produto e meu talento, porque vai fazer parte da vida de outra pessoa. Eu não vejo só como um trabalho, mas um prazer e uma gratidão”, disse. Produto social: tapetes de tricô com tecidos descartados por malharias da artesã Candida Santos de São Carlos. — Foto: Amanda Rocha/g1 Papelaria e gravura artesanal Também na linha da sustentabilidade, o artista educador Leonardo Gonçalves Gomes (Leozito), de 42 anos, usa chinelos, bagaço de cana, caixinhas de suco e de leite, embalagens de chá e diferentes plantas para fazer peçasa de papelaria artesanal. Pesquisador de engenharia de materiais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), ele estuda também a possibilidades de arte menos tóxicas, levando em consideração o custo, o acesso e a possibilidades de renda a partir de resíduos sólidos e papel reciclável. O artista educador Leonardo Gomes desenvolve também pesquisas na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar ). — Foto: Émilie Aizier A gravura “Pegada poética” é feita a partir de uma matriz de solados de sapatos usados e estampa o trabalho dos garis. O educador parte de inspirações filosóficas e do cotidiano para chegar ao papel ecológico e em equilíbrio com o meio ambiente. “Tanto a matriz dos trabalhos como o papel são pensados a partir dos resíduos. A ideia da gravura é no sentido daquilo que a gente deixa no mundo. É impossível não deixarmos rastros. Penso muito a relação com o meio ambiente e nossa morada, Resíduo e residência tem a mesma etimologia. Me inspiro muito nos catadores de reciclável que contribuem tanto para a sociedade”, disse. Pegada ecológica (2022) é uma gravura em relevo sobre chinelo. Artista de São Carlos se inspira no trabalho dos garis, meio ambiente e filosofia. — Foto: Arquivo pessoal As técnicas da papelaria são diversas e incluem cozimento, liquidificadores e processos manuais. Ele usa diferentes tipos de fibras orgânicas. Abacaxi, bananeira, sementes e espada de São Jorge já foram testadas e aprovadas no processo do papel artesanal. Ele também reaproveita caixas tetra pak ou longa vida e as transforma em gravuras por meio de uma técnica conhecida como ponta seca, que consiste em pegar um objeto pontiagudo e riscar uma superfície lisa. Antigamente os registros eram feitos em cobre ou outro metal. “Adapto essa técnica para as embalagens, pode ser com uma lapiseira, agulha, prego. Você incide rasgando uma linha na embalagem, corta, passa a tinta e através de uma uma prensa o desenho é estampado no papel”, finalizou. Matriz de embalagem longa vida (esquerda) e impressão da gravura pronta a direita: trabalho feito com matrizes de papel sobre papel artesanal reciclado. — Foto: Arquivo pessoal Exercícios poéticos e éticos Para Leonardo a papelaria artesanal é um exercício poético e ético. Muito do que produz na universidade é ensinado em escolas e oficinas. “Estou ligado a grupos de estudo sobre divulgação científica desses processos artísticos para levar isso para escolas. Não é só gravura ou papelaria, estamos falando de uma formação de pessoas para agir nesse mundo de consumo que vivemos, tem uma dimensão ética e política e não simplesmente técnica”, afirmou.