O Projeto Jaguarubá teve início em 2015 com a plantação de 120 hectares de florestas de madeiras nobres, como o cedro-australiano e o mogno-africano. Em 2020, Heer se uniu ao biólogo e micólogo Marcelo Sulzbacher, e ao engenheiro agrônomo Marcio Frantz, para desenvolver um cultivo específico de trufas. Atualmente, ele divide o espaço da propriedade entre as florestas e áreas de cultivo de trufas, que anteriormente eram pasto para o gado. Pesquisadores utilizaram nogueiras-pecã, árvores adequadas para a produção de trufas, inoculando-as com esporos do fungo — Foto: Lígia Skowronski Eles utilizaram nogueiras-pecã, que são árvores adequadas para a produção de trufas, inoculando-as com esporos do fungo. Isso significa que os esporos de trufas foram introduzidos nas raízes das nogueiras para que as árvores pudessem produzir trufas no futuro. No dia 22 de setembro de 2024, durante a fase de reinoculação das áreas plantadas, a equipe se deparou com uma pequena trufa “Tuber”, ainda imatura. “Foi uma emoção indescritível”, comenta Fernando. O achado não apenas surpreendeu, mas também reafirmou o potencial do Brasil na produção desse fungo raro. Surpreendentemente, a trufa apareceu em menos de dois anos, contrariando a expectativa inicial de quatro a seis anos. “O desenvolvimento foi muito mais rápido do que na Europa ou nas regiões frias do Brasil. Dependendo da espécie, tem trufas que ocorrem a partir do sexto ano, outras a partir do sétimo ou oitavo. O que estamos vendo é que a trufa Sapucay, que acreditamos que seja o caso dessa de Morungaba, e outras espécies que estamos trabalhando, estão ocorrendo mais rapidamente por conta do intemperismo do solo, explica Heer, acrescentando que será realizado um estudo de DNA para identificar a espécie encontrada. Trufas são mais trabalhadas na região sul do Brasil por conta do clima subtropical — Foto: Arquivo pessoal/Fernando Heer O que são as trufas? Os cogumelos trufa, pertencentes ao gênero Tuber, são fungos que se desenvolvem abaixo da superfície da terra, associados às raízes de árvores como carvalhos, castanheiras, nogueiras-pecãs, aveleiras e amendoeiras. De aparência irregular, frequentemente assemelha-se a pequenas pedras. Os cogumelos trufa, pertencentes ao gênero Tuber, são fungos que se desenvolvem abaixo da superfície da terra, associados às raízes de árvores como carvalhos, castanheiras, nogueiras-pecãs, aveleiras e amendoeiras — Foto: Lígia Skowronski Existem diversas espécies, mas as mais renomadas na culinária são as trufas brancas (Tuber magnatum) e as trufas negras (Tuber melanosporum). As trufas brancas, originárias da Itália, são especialmente apreciadas por seu sabor delicado e aroma intenso. Já as trufas negras são encontradas principalmente na França e na Espanha. Embora as trufas cresçam naturalmente em países mais frios, como Itália, França, Espnha, Reino Unido e Irlanda, elas também podem ser cultivadas em regiões do Brasil com características favoráveis, como as Serras Gaúcha e Catarinense — Marcelo Sulzbacher, especialista em fungos comestíveis As trufas chegaram ao Brasil junto com mudas de nogueiras, carvalhos e aveleiras trazidas dos Estados Unidos e Europa. A primeira identificação do fungo em solo brasileiro ocorreu em 2016, feita por Marcelo Sulzbacher, em um pomar de nozes-pecãs em Cachoeira do Sul (RS). A primeira identificação do fungo em solo brasileiro ocorreu em 2016, feita por Marcelo Sulzbacher, em um pomar de nozes-pecãs em Cachoeira do Sul (RS) — Foto: Marcelo Brum A trufa encontrada pelo pesquisador em 2016 pertence à espécie Tuber floridanum e ganhou o apelido de “Sapucay”, que significa “canto dos pássaros” em tupi. A descoberta rapidamente se espalhou, levando outros proprietários de terras a explorar suas plantações em busca dessa iguaria. “As trufas são mais trabalhadas na região sul do Brasil justamente pelo clima subtropical. No Sudeste, os experimentos são mais limitados. Um exemplo é o trabalho do fruticultor Rodrigo Veraldi, de São Bento do Sapucaí, nas montanhas da Serra da Mantiqueira. No outono de 2021, ele encontrou as primeiras trufas em sua propriedade. Mas, em regiões tropicais, como o caso de Morungaba, é algo inédito para o Brasil e para outras regiões tropicais do globo”, destaca Marcelo. Nativa dos Estados Unidos, trufa Sapucay (Tuber floridanum) é “prima” da trufa branca ou “trufa de Alba” (Tuber magnatum), iguaria muito valorizada na alta gastronomia — Foto: Marcelo Brum O futuro da truficultura Esse avanço não só abre novas oportunidades para a truficultura no país, mas também promete impulsionar o turismo e a gastronomia local. De acordo com Marcelo, o Brasil tem um potencial enorme para se tornar um grande polo produtor de trufas no mundo. O proprietário da fazenda Fernando Heer, o gerente Alexandre Natel, o pesquisador esloveno Tine Grebenc e o especialista em trufas comestíveis Marcelo Sulzbacher, durante descoberta da primeira trufa cultivada em clima tropical — Foto: Arquivo pessoal/Fernando Heer O Projeto Jaguarubá está desenvolvendo um “Degustarium”, espaço onde os visitantes poderão vivenciar a experiência de caçar e degustar trufas frescas. A busca por trufas é considerada uma arte, realizada por especialistas conhecidos como trufeiros, que utilizam cães ou até mesmo porcos treinados para detectar o aroma das trufas maduras no solo. Quando encontradas, elas são cuidadosamente desenterradas, mas o processo exige habilidade e um bom conhecimento do momento ideal de colheita. O alto valor das trufas tem atraído atenção de muitos produtores. A variedade Sapucay, que foi descoberta em diversas propriedades brasileiras, chega a custar até R$ 10 mil reais o quilo. Em alguns restaurantes ela é comercializada por até R$ 23 mil o quilo. A variedade Sapucay, que foi descoberta em diversas propriedades brasileiras, chega a custar até R$ 10 mil reais o quilo — Foto: heatherdawson/iNaturalist Em comparação, as variedades mais caras da Europa, como a trufa branca de Alba, comuna localizada na região de Piemonte, norte da Itália, podem alcançar preços de até R$ 99 mil por quilo. Com essa descoberta, o Brasil se posiciona como um potencial líder na truficultura tropical, podendo até exportar tecnologias para regiões afetadas pelas mudanças climáticas, onde o cultivo de trufas se torna cada vez mais difícil. O futuro da truficultura brasileira parece promissor, com perspectivas de crescimento que vão além do mercado interno, desafiando as fronteiras da produção agrícola no país. VÍDEOS: Destaques Terra da Gente
Primeira trufa cultivada em clima tropical é encontrada na região de Morungaba, SP
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