Os valores são retroativos constam como suspenso ou “em aberto” no cadastro da dívida ativa da prefeitura de Piracicaba, de acordo com nota enviada ao g1 pela assessoria de imprensa de um dos proprietários e empreendedores que pleiteiam aprovação de projeto imobiliário Boulevard Boyes e centro comercial na área da antiga fábrica de tecidos. “O valor de R$ R$ 5,78 milhões relativo ao IPTU é retroativo e está sendo questionado na Justiça”, aponta no documento. Consultada pelo g1, a prefeitura de Piracicaba não se pronunciou sobre eventuais dívidas ou pedido de isenção de IPTU por se tratar de imóvel particular. Integrantes de um movimento contrário à instalação do empreendimento na área da Boyes aponta que a área fabril apresenta degradação nos edifícios. “Há a preocupação de degradação proposital para tornar o espaço irrecuperável a fim de levar a cabo o projeto Boulevard Boyes com quatro torres residenciais de 100 metros de altura mais centro de compras”, apontam. Antiga Fábrica da Boyes em Piracicaba — Foto: Claudia Assencio/g1 Pedidos de tombamento A administração municipal afirmou que o Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Piracicaba (Codepac) recebeu solicitação para o tombamento do Conjunto Arquitetônico e Paisagístico Boyes composto pela Antiga Fábrica Boyes, Praça Dona Ermelinda Ottoni de Souza Queiroz e o palacete Luiz de Queiroz, na última segunda-feira (1ª). O pedido de tombamento foi protocolado por representantes do movimento contrário ao empreendimento e que tem eventuais impactos da construção, que prevê torres de até 29 andares em frente ao Rio Piracicaba. “O Palacete Luiz de Queiroz e sua área envoltória foram tombados pelo Decreto n° 7.591, de 28 de maio de 1997. A Antiga Fábrica Boyes e Praça Dona Ermelinda Ottoni de Souza Queiroz também são tombadas, conforme Decreto n° 10.643, de 29 de janeiro de 2004. O primeiro pedido foi feito em 1982 para o Conjunto Arquitetônico da Avenida Beira Rio, Largo dos Pescadores e Rua do Porto. Portanto, os edifícios e a praça já são tombados”, especificou em nota. O documento sobre os débitos foi obtido em março de 2024 pelos advogados do Movimento Salve a Boyes, grupo contrário ao projeto Boulevard Boyes. Grupo faz ato contra empreendimento imobiliário previsto para área da antiga Fábrica da Boyes em Piracicaba — Foto: Eloah Margoni/Sodemap O extrato, segundo o grupo, mostra as movimentações de pagamento, saldo, encargos e pendências no período de quase dez anos, havendo menções em 2013, entre 2015 e 2020 e, depois, de 2022 a 2024. “Durante tal período, os proprietários tinham como dívida principal R$ 4,10 milhões (mi) e pagaram apenas R$ 1,17 mi, deixando R$ 2,93 mi em débito com acréscimo de encargos no valor de R$ 2,84 milhões. Ainda conforme o extrato, em 2023 e 2024, nada foi pago em IPTU referente a R$ 623.340,06 e R$ 548,6 mil, respectivamente”, afirmam. O que dizem os empreendedores Em nota, os responsáveis pelo Boulevard Boyes declararam que asseguram total compromisso com os pagamentos devidos. “Os empreendedores lembram que se trata de uma área particular e que o imóvel não é tombado. A solicitação de redução do valor do IPTU está aguardando a decisão do órgão competente. Paralelamente, os empreendedores questionam judicialmente o valor médio de IPTU de R$ 600 mil ao ano por considerarem que o montante é incompatível com a realidade do imóvel. Esse questionamento integra um processo judicial em andamento”, afirmam. Em documento enviado a pedido do g1, declararam ainda que o “status atual do processo é de aguardo pela decisão judicial quanto aos valores contestados. Como a decisão ainda não foi anunciada, não há números oficiais atualizados nem pendências financeiras até o momento”, concluem. Edifício e praça são tombados, diz Codepac Em nota à reportagem, o Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Piracicaba (Codepac) afirmou que recebeu na segunda-feira (1º) solicitação para o tombamento do Conjunto Arquitetônico e Paisagístico Boyes, composto pela Antiga Fábrica Boyes, Praça Dona Ermelinda Ottoni de Souza Queiroz e o palacete Luiz de Queiroz. No entanto, afirmou que eles já são tombados. “O Palacete Luiz de Queiroz e sua área envoltória foram tombados pelo Decreto n° 7.591, de 28 de maio de 1997. A Antiga Fábrica Boyes e Praça Dona Ermelinda Ottoni de Souza Queiroz também são tombadas, conforme Decreto n° 10.643, de 29 de janeiro de 2004. O primeiro pedido foi feito em 1982 para o Conjunto Arquitetônico da Avenida Beira Rio, Largo dos Pescadores e Rua do Porto”, detalhou. Empreendimento O projeto de construção do empreendimento imobiliário particular no local onde funcionou a antiga fábrica de tecidos “Boyes”, no Complexo Beira Rio em Piracicaba, foi indeferido pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat) em março de 2024, conforme informou o órgão do governo estadual ao g1. A decisão do Condephaat, órgão da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo, levou em conta aspectos como efeitos negativos do projeto ao entorno da área da fábrica. A medida cabe recurso. “O parecer do Conselho acompanhou a análise técnica da Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico (UPPH) quanto ao prejuízo à paisagem da área envoltória da Casa do Povoador em parâmetros de ambiência, destaque e visibilidade”, aponta em parte da nota enviada ao g1. O projeto prevê que seis dos 13 prédios da área da antiga fábrica, em frente ao Rio Piracicaba, devem ser demolidos para construção do empreendimento. As edificações, são tombadas desde 2004 pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural (Codepac) de Piracicaba (SP), em instância municipal. Em trecho do documento enviado ao g1, o Condephaat esclareceu que a medida cabe recurso da decisão do Conselho, caso o interessado desejar. Na ocasião, o g1 entrou em contato com a empresa responsável pelo empreendimento imobiliário Boulevard Boyes. Em nota, o grupo KT Arquitetura e Negócios afirmou que ainda não foi notificado da decisão. Entenda o caso A demolição foi aprovada com maioria dos votos dos membros do Codepac durante reunião extraordinária do Conselho, em junho do ano passado. Foram 12 votos favoráveis, um contrário e duas abstenções. O que diz a empresa responsável Em novo pronunciamento ao g1, na tarde desta terça-feira (12), o grupo KT Arquitetura e Negócios afirma que o projeto segue legislação vigente e pretende oferecer espaço com valor histórico à cidade. 👇Veja documento, na íntegra, abaixo. “Entendemos e respeitamos o importante trabalho do Condephaat- Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico. Informamos que não recebemos nenhuma notificação até o momento. Assim que tivermos acesso aos apontamentos, complementaremos com as informações que serão solicitadas ajudando a esclarecer o projeto e seu propósito. Nosso projeto segue rigorosamente em acordo com a legislação vigente, mantendo a proposta de trazer para Piracicaba um espaço com valor histórico em harmonia com inovação, sustentabilidade, bem-estar e qualidade de vida. Vale lembrar que o Boulevard Boyes é um projeto único, totalmente ESG – Ambientalmente, Social e com Governança alinhada com a Sociedade Civil e Governo, que une passado e futuro com total responsabilidade. O empreendimento oferece espaço público cultural com Museu, oportunidades aos pequenos produtores e artistas locais e entretenimento a todas as classes sociais, preservando e valorizando a natureza, o turismo e o legado histórico do que é de fato importante para Piracicaba. Estão previstas a criação de dois mil empregos diretos e indiretos, beneficiando com renda e trabalho mais de oito mil pessoas, fortalecendo a economia local, gerando novas receitas e impostos gerados, possibilitando o poder público investir em saúde, segurança e educação. A remoção seletiva dos prédios sem valor histórico, que foram construídos ao longo da existência da Fábrica Boyes, vai valorizar a arquitetura histórica original, que é vista, visitada ou mesmo conhecida. A natureza e a área de preservação permanente às margens do Rio Piracicaba serão intocáveis e respeitadas. As torres residenciais serão sustentáveis, afastadas do rio, respeitando a altura permitida por lei e integrando-se arquitetonicamente ao Engenho Central e a cidade”. Antiga Fábrica da Boyes em Piracicaba — Foto: Claudia Assencio/g1 O que diz a prefeitura Consultada em outubro e novembro de 2023 pelo g1, após aprovação da demolição de parte dos prédios do antigo complexo industrial da Boyes, a prefeitura de Piracicaba afirmou que “O projeto atual manteve parte do programa apresentado e aprovado anteriormente, e também a intenção de preservar os mesmos edifícios e elementos arquitetônicos considerados relevantes para o conjunto, além de incluir elementos solicitados pelo Codepac”, informou em nota. Audiência pública Em 22 de novembro de 2023, uma audiência pública na Câmara para debater a proposta de construção do empreendimento imobiliário reuniu representantes da empresa responsável pelo projeto arquitetônico, membros da sociedade civil, ambientalistas, professores, arquitetos, conselheiros, bem como do poder público, entre vereadores, secretários e defensoria. Prédio da Câmara Municipal de Piracicaba — Foto: Davi Negri/ Câmara Municipal de Piracicaba Durante o debate, a empresa responsável pelo projeto disse que área do “Boulevard Boyes” terá 60% de acesso público. Entre os argumentos de representantes da sociedade civil contrários às obras, o grupo questionou se toda população teria condições de frequentar o local. Manifesto Na Praça José Bonifácio, o grupo se reuniu para expor a situação, apresentar comentários sobre o projeto arquitetônico e eventuais impactos da construção, que prevê torres de até 29 andares em frente ao Rio Piracicaba. Grupo percorre ruas do Centro de Piracicaba em direção à Praça José Bonifácio durante manifestação contra demolição de prédios tombados e construção de empreendimento na área da antiga fábrica ‘Boyes’ — Foto: Adriano Sgrignero/@adriano_sgrignero Em fevereiro deste ano, representantes do movimento denunciaram que o local vem sendo degradado continuamente. Procurada, a prefeitura informou que o prédio é particular e que cabem aos proprietários tomarem as devidas providências para manutenção e conservação do prédio. Nesta segunda-feira (11), o grupo protocolou pedido de tombamento de toda área do Complexo Beira Rio, na região da Rua do Porto de Piracicaba, ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Interesse público O professor Lino Castellani Filho questionou se as pessoas em geral, especialmente classes mais baixas, terão poder aquisitivo para frequentar o empreendimento, caso o projeto seja executado. “Isso de fato é de interesse público, mas qual público? Qual público que está sendo visado? Não é o público majoritário de Piracicaba. Nós não queremos que em Piracicaba o conceito de cidade empresarial prevaleça sobre aquele centrado no conceito de desenvolvimento sustentável”, diz. Reprodução projeto arquitetônico apresentado durante audiência pública na Câmara de Piracicaba — Foto: Reprodução/ KT Arquitetura de Negócios ‘Terreno terá 60% de acesso público’, diz arquiteto Durante a audiência, o arquiteto Julio Takano, CEO da empresa de arquitetura, apresentou o projeto e disse que 60% do terreno será de acesso público. “O acesso da comunidade a este espaço é um diferencial que nós queremos trazer. Piracicaba não merece perder esse patrimônio por um desleixo onde a gente pode querer preservar ou abandonar esse patrimônio, mas sim revitalizá-lo. E nós estamos aqui como especialistas para ajudar nessa revitalização”, diz. O requerimento assinado pelas parlamentares indica, ainda, que “o projeto colocaria em risco a manutenção da essência e da alma da cidade de Piracicaba” e que “foi aprovado sem uma consideração cuidadosa dos potenciais impactos negativos na comunidade e no meio ambiente, além da falta de um debate público amplo e detalhado”, destaca em trechos do documento. Torres de até 29 andares O texto defende que “a construção de quatro torres de 29 pavimentos e 90,5 metros de altura alterariam significativamente o skyline da cidade e impactariam a apreciação dos elementos históricos e naturais da região, caracterizando uma verticalização Excessiva e área não apropriada” e que “a inclusão de 440 unidades residenciais e 1500 vagas para automóveis poderia sobrecarregar a infraestrutura viária da cidade, dificultando o acesso e prejudicando o trânsito local”, conforme justificativas expostas no requerimento. Empresa de arquitetura A empresa de arquitetura responsável pelo projeto Boulevard Boyes apresentou a proposta no dia 3 de dezembro, no Espaço Beira Rio, e apontou como “aspectos positivos” os seguintes pontos: revitalização e a valorização da fisionomia dos prédios históricos preservação, construções de novos espaços, cubos comerciais para pequenos empreendedores (artistas e artesões)criação de torresresidenciais totalmente sustentáveis, com arquitetura integrada com os prédios preservados e ao próprio Engenho Central Projeto Boulevard Boyes — Foto: Reprodução/KTV A empresa aponta que o projeto foi aprovado pelo Codepac com a maioria de votos dos conselheiros. “Por quase dois anos, o órgão avaliou os detalhes, solicitando ajustes, os quais foram incorporados na sua totalidade pela equipe técnica do Boulevard Boyes”, afirma. “As torres atendem aos pré-requisitos da Prefeitura de Piracicaba no tocante à altura e sombreamento. Pela legislação, as torres poderiam ter até 29 andares e apenas uma torre tem 27 andares, portanto dois andares abaixo do limite legal”, detalha a empresa de arquitetura responsável pelo projeto. Altura das torres Ao g1, a empresa salienta que torre mais alta do residencial Boyes é apenas a 25ª torre mais alta de Piracicaba ficando 58,5 metros abaixo do edifício de cota mais alta. “Esta diferença equivale, por exemplo, a ter outro prédio de aproximadamente 19 andares entre a torre Boyes e a de cota mais alta na cidade”, diz a empresa de arquitetura. “O projeto foi desenvolvido no sentido de preservar este singular remanescente industrial, integrante do patrimônio e da paisagem cultural dos piracicabanos”, diz o arquiteto Julio Takano, CEO da empresa. Novo shopping de Piracicaba nunca inaugurado teria usina para geração de energia própria — Foto: Claudia Assencio/G1 Demolição Seis dos 13 prédios da área da antiga fábrica da Cia. Industrial “Boyes”, em Piracicaba deverão ser demolidos para construção de empreendimento imobiliário particular. As edificações, localizadas na Rua Antônio Corrêa Barbosa perto da Ponte Pênsil, são tombadas desde 2004 pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural (Codepac) da cidade. A demolição, apesar de questionada por membros do Codepac, foi aprovada com maioria dos votos durante reunião extraordinária do Conselho, em junho deste ano. Foram 12 votos favoráveis, um contrário e duas abstenções. Questionada sobre o projeto, a Prefeitura de Piracicaba informou, em nota enviada ao g1 no dia 13 de outubro, que a demolição foi autorizada porque, entre outros fatores: “Esses prédios já sofreram descaracterizações internas e externas, que impossibilitaram a valorização de qualquer legado arquitetônico”, comunicou em trecho do documento. Maquinário da usina que gerará energia renovável para abastar shopping de Piracicaba — Foto: Claudia Assencio/G1 No mesmo espaço, um projeto que não se concretizou, previa construção de shopping onde haveria uma usina para geração própria de energia renovável e sem impacto ambiental. A previsão de inauguração era para 2017. Contrapartidas Em ata da reunião que aprovou a demolição, assinada pelo presidente, Esio Antônio Pezzato, e 1º secretário do Codepac, Álvaro Luis Saviani, há menções aos questionamentos e pedidos de ressalvas feitos por outros membros do Conselho sobre os pontos, abaixo. O empreendimento foi lançado em 2015, de acordo com o divulgado pelos responsáveis pelo empreendimento na época. Antiga fábrica de tecido Boyes em Piracicaba — Foto: Claudia Assencio/g1 A Pequena Central Hidrelétrica (PCH), criada por Luiz de Queiroz em 1892, onde também funcionava a fábrica de tecidos Boyes, teria sido recuperada e restaurada, segundo informações publicadas na época. As obras que permitiam a reativação das máquinas foram entregues em outubro daquele ano. Entre os aspectos mencionados pelos conselheiros, destacam-se: Preocupação com a descaracterização do conjunto tombado diante da previsão de construção de quatro torres, de mais de 90 pelo projeto da empresa responsável pelo empreendimento imobiliário, a SPE Piracicaba. Sugestão de contrapartidas a serem oferecidas pelo empreendimento como restauro e requalificação da Praça Boyes, integra conjunto patrimonial tombado, por seu aspecto histórico, cultural e fabril; detalhamento de espaços que serão de acesso e interesse público; construção de memorial da antiga tecelagem.Além disso, pedem ainda estudos de impacto ambiental e de uso do solo, análise e relatório de impacto de vizinhança, bem como o licenciamento e execução de medidas mitigadoras e compensatórias. Projeto ainda não foi aprovado Em nota, a Prefeitura de Piracicaba (SP) afirma que o projeto não foi aprovado e nem passou por apreciação de nenhuma secretaria do Executivo. “O Codepac esclarece que o que foi apreciado pelo conselho, após estudo extenso por comissão formada por técnicos durante um ano e meio, foi o restauro dos edifícios remanescentes no local. Nesse estudo aprovado, todas as edificações de importância histórica do conjunto fabril serão devidamente preservadas e restauradas. Quanto à realização do empreendimento, a aprovação de novas construções, análise ambiental e demais, necessárias para aprovação e execução, devem passar pelos órgãos técnicos com essa competência, como quaisquer outros empreendimentos do município. Dessa forma, o atual projeto do empreendimento ainda não está aprovado para construção, conforme divulgado de forma errônea em redes sociais”, finaliza. VÍDEOS: Tudo sobre Piracicaba e região