O projeto de divulgação científica “Pokeplants”, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa em Sistemática e Taxonomia de Angiospermas da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), mostra essa relação entre elas e os personagens. Segundo o coordenador do grupo de pesquisa Lucas Cardoso Marinho, a espécie Rafflesia arnoldii inspirou o Pokémon “Vileplume”, conhecido por sua grande flor vermelha com manchas brancas no topo da cabeça. Ele exala um pólen tóxico e pesado, capaz de causar reações alérgicas. A ideia foi baseada no cheiro forte e desagradável da flor. “Nós descobrimos que ele é baseado na raflésia, mas tem algumas diferenças morfológicas. Por exemplo, acessando a Pokédex, que é uma a publicação da companhia Pokémon, eles dizem que o Vileplume tem pétalas, mas a planta não tem pétalas, ela só tem sépalas. Então isso é uma forma de ensinar botânica usando o Pokémon”, explica o coordenador. Flor do gênero Rafflesia tem cheiro forte e desagradável. — Foto: Pierre-Louis Stenger/iNaturalist Além de publicações nas redes sociais para levar o tema ao público leigo e aos estudantes universitários, o grupo de pesquisa também divulga artigos em revistas científicas sobre a relação dos personagens com os vegetais. Até o momento, houveram publicações nos periódicos “A Bruxa” e “Journal of Geek Studies”. A botânica Caroline Ferreira explica que, no Brasil, não existe nenhum registro de ocorrência de espécies do gênero Rafflesia. O grupo é formado por 42 espécies de plantas, que podem ser encontradas nas florestas das Filipinas, Bornéu, Java, Sumatra e Malásia Peninsular. Conhecidas como flores-cadáver, as flores do gênero Rafflesia tem aspecto carnoso e exalam um aroma de carne em decomposição. O motivo disso? Atrair moscas-de-carniça (dos gêneros Lucilia, Sarcophaga, Chrysomya, entre outros), que realizam a polinização da planta. De acordo com Caroline, há relatos de que algumas espécies podem até mesmo produzir calor, na tentativa de imitar o corpo de um animal recém-morto e atrair as moscas. Dependentes dos agentes polinizadores para a reprodução, as flores masculinas e femininas das raflésias precisam florescer em sincronia e a menos de um quilometro de distância para que o pólen possa ser transferido com sucesso. A duração da flor é de menos de uma semana. Espécies desse gênero não tem caules, raízes ou folhas – ou seja, não fazem fotossíntese. — Foto: Megan Crewe/iNaturalist Após a polinização, o processo de maturação do fruto leva de 6 a 8 meses, e assim as sementes estão prontas para serem dispersas. Os pesquisadores acreditam que as sementes sejam dispersas principalmente por animais, como pequenos mamíferos, elefantes e até formigas. Uma hipótese é que elas possam carregar as sementes dos frutos para o ninho, então a semente germina e infecta a raiz de um indivíduo hospedeiro mais próximo. Planta que não faz fotossíntese? Espécies desse gênero não tem caules, raízes ou folhas – ou seja, não fazem fotossíntese. Como plantas parasitas, elas dependem totalmente do hospedeiro para se alimentar e crescer. Por isso, são constituídas apenas por uma rede de pequenos vasos, estruturas de sucção chamados haustórios, que penetram nos vasos condutores das plantas hospedeiras, retirando daí o seu alimento. Quando não estão floridas, as raflésias ficam quase invisíveis quando estão parasitando raízes de videiras do gênero Tetrastigma (plantas da mesma família da uva), que normalmente são suas hospedeiras. Ainda segundo a botânica, há registros de indivíduos de Rafflesia arnoldii que possuem cerca de um metro de diâmetro e peso de até 11 quilos. A espécie detém o título de maior flor do mundo. Flores podem pesar até onze quilos — Foto: Scott Globetrots/iNaturalist “Não há na literatura informação que explique o porquê de as flores pertencentes a esse gênero serem tão grandes. No entanto, uma vez que as flores são enormes, há um número maior de osmóforos nas pétalas (estruturas produtoras do perfume fétido), e com isso o raio de alcance de polinizadores também é maior”, explica Caroline Ferreira. Um fato interessante é que, apesar do tamanho avantajado das flores, a família Rafflesiaceae é grupo irmão e mais próximo da família Euphorbiaceae (que inclui espécies como mamona, seringueira e mandioca), que possui flores bem pequenas em sua maioria. O gênero Rafflesia foi nomeado assim em homenagem ao político britânico Thomas Stamford Bingley Raffles que, com o auxílio do botânico Joseph Arnold, coletou um exemplar em 1818 durante uma expedição na Sumatra. Hoje se sabe que a descoberta da primeira espécie de raflésia foi feita em 1797, pelo francês Louis Auguste Deschamps, enquanto estava em expedição pela Ásia e Pacífico. No entanto, quando retornava para a Europa, seu navio foi tomado pelos ingleses em virtude das Guerras Revolucionárias Francesas (1792-1802), e por isso teve todos os seus registros e anotações confiscados. Tais registros foram apenas resgatados em 1954. O gênero Rafflesia foi nomeado assim em homenagem ao político britânico Thomas Stamford — Foto: Cynthia Chan/iNaturalist Não bastando o passado complicado, o futuro da planta também é incerto. “Infelizmente esse grupo está ameaçado de extinção devido à destruição de habitat e colheita ilegal por benefícios medicinais que até hoje não foram comprovados, sendo tratados nos artigos como ‘questionáveis’”, alerta a pesquisadora. Para proteger as que ainda restam, os pesquisadores sugerem realizar estudos mais detalhados e fazer a propagação da espécie em jardins botânicos, viveiros e laboratórios; investir em iniciativas de ecoturismo e aumentar áreas protegidas nos trópicos asiáticos. VÍDEOS: Destaques Terra da Gente
Maior flor do mundo ‘engana’ moscas, parasita plantas e pode pesar até 11 kg
0