Neste domingo (8), os grupos rebeldes que combatem o regime anunciaram que Assad deixou a capital Damasco e tem destino desconhecido. Caso se confirme, a queda do regime consolida uma ofensiva que, em apenas 10 dias, mudou drasticamente os rumos de uma guerra que já dura 13 anos. Segundo relatos publicados pela imprensa internacional nas últimas horas, há membros das forças rebeldes circulando em Damasco e tiroteios ocorrendo em alguns pontos. A agência Reuters informou que os rebeldes dizem estar entrando em Damasco sem resistência das Forças Armadas. No sábado (6), o governo sírio acusou os insurgentes de espalharem informações falsas sobre o conflito para aterrorizar a população e criar instabilidade. O ministro do Interior disse que há um “cordão militar” para proteger Damasco. A ofensiva é liderada pelo movimento extremista Hayat Tahrir al-Sham (HTS), ou Organização para a Libertação do Levante, que surgiu como uma filial da Al Qaeda, grupo por trás dos atentados do 11 de Setembro. A marcha começou em Aleppo, no norte, passou por Homs e seguiu rumo à capital, que está mais ao sul. Outras frentes opositoras partiram do sul e do leste, com o objetivo de fechar o cerco a Damasco. Por onde passaram, os rebeldes derrubaram estátuas que homenageiam Hafez al-Assad, pai do atual presidente e fundador da dinastia que está no poder há 50 anos, e tomaram bases militares. No leste, uma outra frente é liderada por forças curdas, também adversárias de Assad. Veja a cronologia do avanço rebelde na Síria — Foto: Infográfico/g1 No sábado, ainda numa tentativa de encontrar uma saída diplomática, representantes de Rússia, Turquia e Irã se reuniram no Catar para pedir diálogo entre o governo sírio e as forças opositoras. No entanto, o chanceler russo, Sergei Lavrov, disse que a negociação não deve incluir os extremistas do HTS. “É inaceitável permitir que um grupo terrorista assuma o controle de territórios”, afirmou o ministro de Putin, segundo a agência de notícias russa Tass. O conselheiro de segurança nacional dos Estados Unidos, Jake Sullivan, disse que Assad foi abandonado por seus principais aliados, Rússia e Irã, e ficou numa posição frágil. Abu Mohammed al-Golani, líder das forças rebeldes que tentam derrubar ditador Bashar al-Assad na Síria — Foto: Media Branch of Syrian Rebel Operations Room/via Reuters Retomada da guerra A guerra civil na Síria começou em 2011 e, nos últimos quatro anos, parecia estar adormecida. Após um período sangrento de confrontos, que deixaram cerca de 500 mil mortos e causaram um enorme êxodo de sírios, o ditador conseguiu manter o controle sobre a maior parte do território graças ao suporte da Rússia, do Irã e da milícia libanesa Hezbollah. No entanto, agora a Rússia está em guerra com a Ucrânia, e o Irã vive um conflito com Israel. O Hezbollah, por sua vez, perdeu seus principais comandantes neste ano, mortos em ataques israelenses. Para os analistas, essa situação faz com que nem Putin nem o regime iraniano estejam dispostos a entrar de cabeça em mais uma guerra. Um porta-voz do governo da Ucrânia disse que a escalada do conflito na Síria mostra que a Rússia não consegue lutar em duas guerras ao mesmo tempo. Informações publicadas no sábado indicam que o Hezbollah e o regime iraniano estão retirando tropas que mantêm na Síria. Assad e o presidente russo, Vladimir Putin, em foto de 2017 — Foto: Mikhail Klimentyev/Sputnik via Reuters O cientista político Guilherme Casarões, da Fundação Getúlio Vargas, diz que não é uma coincidência a ofensiva ter sido lançada agora. “Aqueles que eram os três principais aliados do governo Assad, Hezbollah, Irã e Rússia, estão meio que fora desse envolvimento direto com o conflito, o que abriu uma oportunidade para que os rebeldes tentassem retomar certas posições estratégicas dentro do país. Aleppo, sendo a segunda maior cidade da Síria, é o primeiro destino que eles ocuparam.” Segundo o professor, o acirramento do conflito pode ter consequências em todo o Oriente Médio. Se Assad cair, afirma ele, isso pode criar um vácuo de poder e escalar ainda mais as guerras que envolvem Israel, Hamas, Hezbollah e Irã. Entenda o que está acontecendo na Síria, que tem avanço de grupo rebelde O que está acontecendo na Síria A ofensiva dos rebeldes reacendeu a guerra na Síria, que estourou em 2011, quando o governo reprimiu manifestações da Primavera Árabe. Naquele momento, as manifestações começaram de forma pacífica, com movimentos pedindo mais democracia e liberdades individuais. Os manifestantes também acusavam o governo de corrupção e nepotismo. Rebeldes comemoram tomada de aeroporto militar na cidade de Hama, na Síria — Foto: Mahmoud Hasano/REUTERS Diante da repressão violenta do Exército, o governo sírio viu surgir uma revolta armada apoiada por militares desertores e grupos terroristas, entre eles o Estado Islâmico. Nesse contexto, começou uma guerra civil. À época, grupos rebeldes entraram em conflito com as forças de Assad, que perdeu o controle de alguns territórios, mas conseguiu se manter no poder. Com o tempo, Assad retomou o controle de cerca de 70% do território. Repercussão internacional Donald Trump em Paris, 7/12/2025 — Foto: Sarah Meyssonnier / Pool / AFP O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, que toma posse em janeiro, defendeu que o país não deve se envolver no conflito. “A Síria é uma bagunça, mas não é nossa amiga, e os Estados Unidos não têm nada a ver com isso. Esta luta não é nossa, deixem que aconteça. Não se envolvam”, escreveu Trump em um post na rede Truth Social. O presidente da Turquia, Tayyip Erdogan, disse que cabe ao povo sírio decidir o futuro do país. “Agora há uma nova realidade na Síria, política e diplomaticamente. E a Síria pertence aos sírios com todos os seus elementos étnicos, sectários e religiosos”, disse. “O povo da Síria é quem decidirá o futuro de seu próprio país. Como Turquia, nosso desejo é que a nossa vizinha Síria recupere rapidamente a paz, a estabilidade e a tranquilidade que tanto anseia há 13 anos”, completou Erdogan. Há anos, a Turquia apoia forças de oposição na Síria. O ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Tobias Lindner, pediu que as partes envolvidas no conflito “diminuam a tensão e lembrem de sua obrigação de proteger os civis”.