A saúde mental, como vai? Cuidar da saúde mental e emocional de padres e religiosos é um bem para toda a comunidade. Entrevista com Frei Vagner Sanagiotto. Rafael Pierobon “Eu vim para servir” ou “Eu sou o Bom Pastor. O Bom Pastor dá a vida por suas ovelhas” são citações bíblicas comumente escolhidas como lemas de vida por aqueles que buscam as ordens sacras ou a vida religiosa. As falas do próprio Jesus para se autodefinir, bem como para caracterizar sua missão, são incorporadas também por padres, religiosos e religiosas. No entanto, ao longo da vida muitos deles são tocados não apenas pela mística do chamado e pela beleza da vocação, mas também por desafios inerentes à natureza humana, que não podem ser ignorados. Casos de depressão e outras alterações na saúde mental são cada vez mais comuns na vida de padres e religiosos. Ou apenas estão mais evidentes agora porque se tem falado mais sobre o assunto? De fato, este tema ainda é um tabu, já que existe a ideia, em parte das pessoas, de que doenças psicológicas estão ligadas à falta de fé, por exemplo. Lançar luz e conscientizar a sociedade sobre saúde mental e emocional a partir da prevenção das doenças decorrentes do estresse, como ansiedade, depressão e pânico, são os propósitos da Campanha Janeiro Branco. Por isso, o frade carmelita Vagner Sanagiotto, doutor em Psicologia pela Universidade Pontifícia Salesiana de Roma, tem se dedicado a pesquisar e trabalhar na área da psicopatologia na vida religiosa e presbiteral. Ele conversou com o Vatican News sobre a importância de cuidar da saúde mental de religiosos e padres, não só para benefício deles próprios, mas de toda a comunidade. Frei Vagner, abordar o tema da saúde mental entre os padres e os religiosos, religiosas consagradas, causa certa estranheza. Por que ainda há dificuldades em tratar deste assunto? A saúde mental no contexto formativo à Vida Religiosa Consagrada e Presbiteral é um desafio para os dias atuais. Em sentido mais amplo, ainda persiste um tabu sobre a saúde mental do padre ou do religioso, do consagrado e da consagrada, principalmente do adoecimento psicológico. Como se houvesse a ideia de que “por estarem mais próximos de Deus” estes estão imunes do sofrimento psíquico. E a realidade nos mostra que existe o sofrimento psicológico entre os padres e os religiosos/as consagrados/as. Por isso a importância de tratar deste assunto hoje em dia? Exatamente. Nos últimos 10 anos as nossas pesquisas e a prática clínica nos revelam o aumento na preocupação com a saúde mental no contexto eclesial brasileiro: os casos de suicídio, os preocupantes níveis de Burnout, o aumento na incidência das psicopatologias etc. Tudo isso nos indica que precisamos falar sobre este assunto. É aí que entram as campanhas de conscientização, como o Janeiro Branco? Campanhas de conscientização, tal como o Janeiro Branco, buscam romper com os estigmas que segregam e impedem o cuidado adequado com a saúde mental e emocional. E isto também serve para os contextos formativos da Vida Religiosa Consagrada e Presbiteral. Janeiro, mês que renovamos os nossos sonhos e projetos, marca um novo recomeço, como uma página em branco para reescrever uma nova história. Mas, quais são os principais tipos de psicopatologias que acometem padres e religiosos? A que isso se deve? As pesquisas não indicam uma tendência a determinada psicopatologia no contexto formativo da Vida Religiosa Consagrada e Presbiteral. O sofrimento psíquico do padre ou do/a religioso/a consagrado/a pode se manifestar na psicopatologia, tais como depressão, ansiedade, estresse, burnout etc. Mas, também, nas sintomatologias vindas das crises, tais como, crise vocacional, crise existencial, solidão, conflitos relacionais, desmotivação etc. A busca pelas causas depende muito do quadro psicológico e da história de vida de cada religioso/a consagrado/a ou padre. O importante é buscar ajuda profissional (psicólogo ou psiquiatra) desde os primeiros sintomas ou sinais que nos causam estranheza comportamental. “Cuidar dos cuidadores.” Essa é uma expressão que o senhor tem usado. Quem é que tem cuidado desses padres e religiosos, desses cuidadores, e de quem é essa responsabilidade? Em outras palavras, como cuidar deles? A vocação à vida religiosa Consagrada e Presbiteral é caracterizada pela doação total ao outro. Isso implica o envolvimento pastoral e emocional no exercício do cuidado. Mas, aquele que cuida também precisa ser cuidado. Em se tratando da saúde mental o melhor caminho é sempre o preventivo. Entre as tantas atividades cotidianas que o padre, o religioso, a consagrada tem para fazer, precisa encontrar tempo para o cuidado pessoal, o cultivo espiritual, o exercício físico, uma alimentação adequada etc. Diria que o mais importante, no contexto eclesial, é aprender a cuidar uns dos outros. Quais os benefícios para a comunidade, para a paróquia, para o povo de Deus, quando o padre está mentalmente saudável? Eu não tenho dúvidas que o padre, o religioso, a consagrada que está bem consigo mesmo vai servir melhor ao Reino de Deus, vai estabelecer relações saudáveis, enfim, o cuidado com a saúde mental qualifica o ministério presbiteral e a consagração religiosa. O ideal seria aprender a cuidar-se para cuidar bem dos outros. Talvez esta seja uma regra para o bem-estar humano e vocacional. Atualmente, como as dioceses e ordens religiosas estão lidando com o tema? Estão dando mais atenção a este tema? Percebo que as Dioceses e Congregações Religiosas estão mais atentas à saúde mental dos padres e dos/as religiosos/as consagrados/as. Porém, precisamos entender que cuidar não é somente quando se tem um diagnóstico. Precisamos avançar na direção da prevenção as psicopatologias e da promoção da saúde mental, isto é, agir antecipadamente. – Frei Vagner Sanagiotto, frade carmelita (Comissariado Geral do Paraná), psicólogo, doutorando em Psicologia (Pontifícia Universidade Salesiana – Roma/Itália). Obrigado por ter lido este artigo. Se quiser se manter atualizado, assine a nossa newsletter clicando aqui e se inscreva no nosso canal do WhatsApp acessando aqui
Frei Vagner Sanagiotto: saúde mental entre padres e religiosos
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