Smerilli e Emilce Cuda refletem com a Igreja espanhola sobre o Magistério Pontifício sobre o Trabalho. Padre Modino – Ávila O grande tema é o trabalho. As palavras do Papa Francisco são uma fonte de inspiração para as XXX Jornadas Gerais de Pastoral do Trabalho, realizadas em Ávila nos dias 23 e 24 de novembro de 2024, comemorando o 30º aniversário da aprovação do documento “A Pastoral Operária de toda a Igreja”, um texto que tem sido o marco básico da Igreja espanhola sobre o tema do trabalho. A questão do trabalho na Espanha O bispo de Ávila, Jesús Rico, questionou se a riqueza desse documento foi incorporada à vida da Igreja espanhola e às mudanças produzidas na questão do trabalho, refletindo sobre a forte transformação que ocorreu em relação ao mundo do trabalho, sobre o avanço de uma espiritualidade intimista separada da vida e da autêntica espiritualidade evangélica, bem como o avanço da tecnologia e a nova compreensão do trabalho e do aspecto humano que isso implica. O compromisso com a evangelização do trabalho faz parte do trabalho da Pastoral do Trabalho, enfatizou o bispo de Osma-Soria e responsável pela Pastoral do Trabalho da Conferência Episcopal Espanhola, Dom Abilio Martínez, que analisou o documento “A Pastoral Operária de toda a Igreja”, a partir de diferentes perspectivas, bem como a realidade atual, destacando o aumento dos acidentes e a precariedade no trabalho, que afeta especialmente os migrantes. Olhando para o futuro, ele pediu, na linha do Papa Francisco, a humanização do trabalho, que se concretizaria em diferentes realidades e posições. Irmã Smerilli Evolução da Pastoral Operária “A Pastoral do Trabalho na Pastoral Geral da Igreja” foi o tema de reflexão apresentado pela secretária do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, Alessandra Smerilli. A salesiana respondeu à pergunta sobre por que se preocupar com o trabalho, analisando a evolução da Pastoral Operária ao longo dos anos, identificando os desafios atuais e algumas propostas para o futuro, embora as respostas tenham que nascer de cada contexto. Como diz Smerilli, o trabalho é “um meio de vida, mas também é muito mais. Por meio do trabalho, dizemos ao mundo quem somos, o que sabemos fazer: não conhecemos realmente uma pessoa até que a vejamos trabalhando. O trabalho é uma expressão de nossa dignidade, mas também é compromisso, esforço, capacidade de colaborar com os outros, porque é sempre ‘com’ ou ‘para’ alguém. E, portanto, nunca é um ato solitário. O trabalho é cooperação, é relacionamento, é o lugar onde realmente nos tornamos adultos, é nossa contribuição para tornar o mundo mais bonito. Emilce Cuda O trabalho é uma atividade espiritual Para a religiosa, o trabalho “é sempre uma atividade espiritual, porque antes e por trás de qualquer atividade de trabalho – de uma aula na universidade à limpeza de um banheiro – há um ato intencional de liberdade, que é o que faz a diferença entre um trabalho bem feito e um trabalho mal feito”. Além disso, “o trabalho é a satisfação da vocação das pessoas, que está em nós mesmos”, afirmando que a encarnação está na base da preocupação da Igreja com o trabalho, porque “o trabalho é uma dessas experiências decisivas na vida de Jesus em Nazaré”, analisando o conceito de trabalho na Bíblia e no Magistério da Igreja. No atual pontífice, ela destacou a conexão entre o trabalho e o cuidado com a criação na Laudato si’. Sobre o caminho percorrido pela Pastoral do Trabalho, a religiosa enfatizou a passagem de uma lógica vingativa para um método de acompanhamento, “acompanhando empregadores e trabalhadores para que se vejam como parte de uma comunidade e de um projeto”, passando de questões individuais para interconexões, O fato de tocar a vida das pessoas, as condições vitais em que se encontram os trabalhadores e as trabalhadoras, dado que “o trabalho não é apenas ganhar a vida, mas imaginar e construir um mundo renovado, atento à centralidade da pessoa”, como aparece em Fratelli tutti, contribui para o amadurecimento pessoal. Trabalho e cuidado A partir daí, ela abordou alguns obstáculos, o paradigma tecnocrático e os limites da meritocracia, além de propostas. Smerilli insistiu na necessidade de compreender que o trabalho não deve ser entendido apenas como ter um emprego ou “fazer coisas”, mas que todas as formas de trabalho têm a ver com o relacionamento com os outros, com a criação e com as gerações futuras. A partir daí, ela destacou o cuidado, os gestos de atenção, algo que não goza de consideração social, pedindo para “trazer a dimensão do cuidado para a esfera pública”, como uma forma de virar o mundo do trabalho de cabeça para baixo. É necessário se afastar da lógica do lucro e do bem-estar imposta pelo paradigma tecnocrático e escolher, como diz o Papa Francisco, a fraternidade em vez do individualismo, ouvir a voz daqueles que estão à margem da sociedade e trazê-los para o centro do processo de mudança. O caminho a seguir é concentrar-se nos trabalhadores descartados, já que uma sociedade não pode progredir descartando, que “um bem não pode ser bom para mim se não for também bom para o outro”. A partir daí, concluiu mostrando o desejo de, como Igreja, “continuar a denunciar, vislumbrar novas perspectivas, acompanhar processos”. Smerilli e Emilce Cuda Entendendo o valor do trabalho organizado Emilce Cuda, Secretária da Pontifícia Comissão para a América Latina, que, junto com Smerilli, representam a nova Igreja do atual Pontífice, que coloca mulheres qualificadas em cargos de decisão na Cúria Romana, iniciou sua reflexão falando sobre o acordo coletivo de trabalho e os tribunais trabalhistas como chaves para entender o valor do trabalho organizado, para saber que dele dependem as garantias dos trabalhadores. 62% dos trabalhadores do mundo atual sofrem com a falta de direitos, o que deve levar a pensar em criar novas organizações para poder incluir essas pessoas, como diz o Papa Francisco. Os direitos surgiram quando os trabalhadores, na época da Revolução Industrial, descobriram que “a injustiça que sofrem não é um castigo divino, mas uma consequência das relações sociais e das situações sociais”, de acordo com Cuda. Isso impediu que muitos entendessem o que é o diálogo social, um dos pontos centrais da Fratelli tutti. A teóloga argentina insistiu na necessidade de se organizar para evitar que morram os defensores do atual Magistério pontifício, que aponta para a ecologia, uma realidade presente na América Latina, de onde, por meio da comissão da qual é secretária, busca construir pontes de inclusão, de reconciliação e fraternidade, dentro da Cúria e entre as diferentes regiões do planeta, respondendo ao que propõe a Praedicate Evangelium, que começa falando sobre como pregar o Evangelho, “com palavras e gestos, tocando a carne sofredora do povo, lavando seus pés”. Habilidades organizacionais Em suas palavras, quis dar um testemunho de como se organizam as relações de trabalho na América Latina, destacando a capacidade de organização, algo que a Igreja realizou com o Conselho Episcopal Latino-Americano e do Caribe (CEAMA) e, mais recentemente, com a Conferência Eclesial da Amazônia (CEAMA), que vai além da dimensão episcopal e parte das fontes da vida, uma luta que está presente no mundo de hoje. Isso é retomado na Doutrina Social da Igreja, “o monumento que a Igreja deixa à modernidade”, segundo Cuda, e que está sendo atualizado, dando continuidade ao caminho percorrido desde a Rerum novarum, indo do egoísmo dos patrões a um sistema econômico que mata, como aparece na Evangelii Gaudium. Como a periferia não é visível, o Papa Francisco, que vem da periferia, tornou essa realidade visível, de acordo com a secretária da CAL. Cuda refletiu sobre a harmonia que nasce da beleza das partes, equivalentes, mas não idênticas, e sobre a harmonia presente no Magistério do Papa Francisco, que começa com a Evangelii Gaudium, onde aparecem os princípios. A partir daí, abordou o conceito de trabalho, do qual depende a sobrevivência, e que deve ser regido por garantias sociais, para as quais é necessário que o Estado o reconheça. Nesse sentido, disse que “a tecnologia nos fez prescindir de muitos corpos nas relações produtivas”, convertendo-os em mercadoria. A teóloga refletiu sobre o papel dos movimentos populares no atual panorama mundial, pessoas que se unem para se salvar, que surgiram nas periferias, que promovem a solidariedade, como uma organização que segue lutando por direitos. Nessa perspectiva, ela explicou o que é e o que representa o diálogo social e o que ele implica no Magistério do Papa Francisco, que parte da realidade, escuta, discerne e parte para a ação, com base em quatro princípios, que podem resolver a crise ecológica socioambiental. Obrigado por ter lido este artigo. Se quiser se manter atualizado, assine a nossa newsletter clicando aqui e se inscreva no nosso canal do WhatsApp acessando aqui