O “novo cangaço” é modalidade criminosa na qual bandidos usam armas e veículos para roubar caixas eletrônicos e cofres de bancos e carros-fortes em cidades pequenas no país. De acordo com a investigação, os principais fornecedores das armas de fogo e das munições utilizadas pela organização criminosa são colecionadores, atiradores desportivos e caçadores (CACs). Até a última atualização desta reportagem, 13 pessoas foram detidas em cumprimento a mandados de prisões temporárias. A seguir, a partir de informações do delegado da PF Jeferson Di Schiavi, entenda como funciona o esquema que abastecia a quadrilha com armamentos: PF apreende 11 armas em operação contra quadrilha do ‘Novo Cangaço’ em Piracicaba Todos os fornecedores da quadrilha têm registro de CAC? Não. Segundo o delegado, ao menos quatro dos presos possui esse registro. Quem são essas pessoas? De acordo com Di Schiavi, elas possuem diferentes profissões, que envolvem ou não posse de armas. Entre eles, há um vigilantes de carros-fortes e um comerciante. A PF ainda apura se eles já integravam a quadrilha antes de se tornarem CACs ou não. Como funciona o esquema de fornecimento? De acordo com o chefe de polícia, os CACs fornecem diferentes armamentos, adquiridos de maneira legal – com uso de suas autorizações para o porte – e de maneira ilegal, sem autorização. “O relacionamento dessa organização criminosa com os CACs foi apurado no sentido de que eles fornecem tanto armas e munições que eles adquirem legalmente, ou seja, eles alugam essas armas, como também pelos canais informais deles. Pelo fato deles estarem numa rede de atiradores, isso facilita com que eles adquiram armamento ilegal”. Embora haja itens com origem legal, a maioria do armamento apreendido é ilegal. Eles se aproveitam de brecha na legislação ou fiscalização? “Os órgãos cumprem a legislação e os criminosos se valem das facilidades da legislação para o fornecimento, para o desvio de finalidade dessas armas e munições”, afirma o delegado. Ele observa que a legislação que rege a aquisição de armas de fogo e munição pelos CACs teve alterações ao longo do tempo. “Então, alguns que já eram proprietários de armas de fogo de alto poder de destruição ficaram com essas armas de fogo. Agora, o que estamos investigando é aquisição de explosivos, pólvoras, silenciadores. Isso ainda está sob investigação”, acrescentou. Polícia Federal apreendeu armas e munições durante operação em Piracicaba — Foto: Polícia Federal/Divulgação Quais armamentos foram encontrados com eles? Segundo a PF, foram encontrados fuzis e explosivos com alto poder de destruição. “Isso que nos chama a atenção. São armas empregadas nessas ações que já são do conhecimento das forças policiais. Nós encontramos pólvora, encontramos artefatos explosivos, granadas caseiras, de fabricação caseira e alguns outros materiais”, elenca Di Schiavi. Em Piracicaba, segundo o 10º Batalhação de Ações Especiais de Polícia (Baep), que deu apoio na operação, além de um fuzil, foram encontradas pistolas, rifle, espingardas, carabina, revólver, silenciadores e munições de vários calibres. Onde e como esses arsenais eram guardados? Em Piracicaba, segundo o delegado, ele estava em um local que já foi uma loja de veículos e onde, atualmente, funciona uma empresa de recicláveis. Neste imóvel, havia um alçapão no teto e os armamentos ficavam armazenados em um compartimento acima da laje. “Esse alçapão foi encontrado em um endereço comercial de pessoa investigada que tem o registro de CAC, em Piracicaba. Essa pessoa tinha com ela armas de fogo legais e sem registro também. […] Não teria motivo dele ostentar registro de CAC e esconder o armamento daquela forma”, comentou. Objetos localizados em endereço de suspeito em Piracicaba foram apreendidos pela Polícia Federal — Foto: Edijan Del Santo/EPTV Em quais ações essas armas foram usadas? Di Schiavi apontou em quais ações a quadrilha estaria envolvida, segundo apuração da PF. “Nós temos indícios veementes de que eles estão envolvidos em pelo menos quatro ações de domínio de cidade. A mais recente, ocorrida em Confresa, no Mato Grosso, em 2023, Criciúma (SC), Guarapuava (PR) e Araçatuba (SP). Foram quatro ações que eles tiveram participação financeira ou atuando no núcleo operacional”, revelou. A quadrilha preparava novas ações? Sim, segundo Di Schiavi. Ele explicou que em uma das casas, no Maranhão, foram apreendidos trajes como camisetas e calças táticas e coletes, que ainda estavam com etiqueta. “É um fardamento bom, a marca, o fornecedor é uma marca boa, conhecida, isso indica que eles estavam prontos para uma nova ação”. “Ao longo das investigações, nós identificamos que eles planejavam um ataque no final do ano passado mas, em decorrência da execução de um dos líderes por outra facção, isso foi adiado”, acrescentou. Armas apreendidas durante cumprimento de mandado em Piracicaba — Foto: Polícia Federal/Divulgação Pelo que essas pessoas foram presas? Foram expedidos 13 mandados de prisão temporária. Entre essas pessoas, quatro também foram presas em flagrante, por conta da posse ilegal de arma de fogo e munição. “Porque o CAC registra um endereço, que é o endereço de acervo, e também as armas de fogo que ele pode possuir. Se tiver em desacordo, por exemplo, ele tem um endereço na casa 1 e a arma de fogo está na casa 2, ele está na posse ilegal de arma de fogo. Eles não estavam possuindo a arma naquele local e também tinham armas não registradas”. Segundo ele, um desses casos foi o ocorrido em Piracicaba, que ele confirmou que se tratava de um acervo clandestino. Como a prisão dessas pessoas inibe esses crimes? “Os principais fornecedores de armas têm o registro de CAC, colecionador e atirador esportivos, e, dessa forma, iniciou-se o processo de desarticulação, de quebra do poder econômico dos financiadores e também dos operadores que vão para essas ações violentas”, explica o delegado. Há mais fornecedores a serem presos? “As investigações ainda continuam em relação a outras pessoas que possivelmente também estão lá, que detêm o registro de CAC, que estão fornecendo arma de fogo para essa organização”, informou Di Schiavi. VÍDEOS: Tudo sobre Piracicaba e região