Após mais de dois séculos, raro exemplar do tietê-de-coroa retorna ao Brasil

Após mais de dois séculos, raro exemplar do tietê-de-coroa retorna ao Brasil

O retorno histórico foi resultado de uma ação integrada entre o Ibama, o MZUSP e o museu alemão. Com isso, pesquisadores brasileiros terão acesso a este valioso material científico sem a necessidade de viagens internacionais, abrindo novas possibilidades para o estudo de uma das aves mais enigmáticas da Mata Atlântica. O exemplar será fundamental para novas pesquisas sobre a espécie, especialmente na compreensão de sua dieta e morfologia. Essa iniciativa democratiza o acesso aos dados, já que muitos espécimes da espécie estão em coleções no exterior. Agora, cientistas brasileiros poderão analisar esse exemplar sem precisar sair do país — Luís Fábio Silveira, biólogo e curador das Coleções Ornitológicas do MZUSP Com o exemplar trazido para o MZUSP, agora são dois exemplares no país, sendo o outro no Museu Nacional do Rio de Janeiro, que era, até então, o único na América Latina. Outros espécimes taxidermizados estão espalhados por diversos museus de história natural ao redor do mundo, em especial na Europa e nos Estados Unidos, devido ao intenso intercâmbio e coleta de material biológico realizada por naturalistas nos séculos XIX e XX. Acredita-se que existam cerca de 100 exemplares em aproximadamente 50 coleções museológicas internacionais. Tietê-de-coroa: um mistério da Mata Atlântica Endêmico de uma pequena área do Sudeste do Brasil, o tietê-de-coroa é uma peça rara da avifauna mundial. Declarado extinto na natureza por mais de cem anos, ele foi redescoberto brevemente em 1996, quando dois indivíduos foram avistados em Teresópolis (RJ). Declarado extinto na natureza por mais de cem anos, tietê-de-coroa foi redescoberto brevemente em 1996, quando dois indivíduos foram avistados em Teresópolis (RJ) — Foto: Divulgação Desde então, a espécie permanece desaparecida, alimentando especulações e estudos sobre seu habitat e as causas de seu quase completo desaparecimento. Segundo Luís Fábio, o desmatamento causado pela expansão cafeeira no Vale do Paraíba foi o principal responsável pelo declínio da espécie. “No século XIX, o habitat da espécie foi destruído de forma brutal e muito rápida. Antes disso, não era uma ave rara, mas o corte raso da vegetação praticamente eliminou qualquer possibilidade de sobrevivência”, explica o biólogo. Espécimes taxidermizados Espécimes taxidermizados são fundamentais para a ciência porque funcionam como cápsulas do tempo, preservando informações únicas sobre espécies, ecossistemas e épocas passadas. Ornitólogo inglês ilustrou o tietê-de-coroa, ave considerada desaparecida — Foto: William Swainson Eles oferecem dados essenciais que ajudam pesquisadores a entender aspectos biológicos, ecológicos e evolutivos das espécies, incluindo aquelas que já desapareceram ou estão criticamente ameaçadas. O exemplar de tietê-de-coroa cedido ao Brasil é mais do que um testemunho histórico. Ele traz consigo a oportunidade de desvendar mistérios da espécie por meio de tecnologias modernas. Uma das técnicas planejadas pelo MZUSP é a análise de isótopos estáveis, que permitirá entender a dieta e habitat do tietê-de-coroa ao longo do tempo. “A técnica funciona como uma janela para o passado. Elementos químicos presentes no organismo do tietê-de-coroa, como carbono e nitrogênio, que se acumulam nos tecidos ao longo da vida do animal, podem revelar detalhes sobre o ambiente em que ele viveu e os alimentos que consumiu, ajudando a reconstruir seu ecossistema perdido”, destaca. A busca por espécies perdidas Embora a espécie continue desaparecida na natureza, seu retorno ao Brasil reacende discussões sobre a conservação de aves criticamente ameaçadas. Desde 1994, o tietê-de-coroa integra a lista da IUCN como “criticamente ameaçado” e, recentemente, entrou no projeto internacional Search for the Lost Birds, que tenta localizar aves não avistadas há mais de uma década. Tietê de coroa — Foto: Devanir Gino/TG Mesmo com expedições recentes, como a realizada pelo Instituto Butantan em 2016, nenhum sinal da espécie foi encontrado. Ainda assim, o exemplar no MZUSP é uma esperança para aprofundar o conhecimento sobre sua biologia e história. Uma herança a ser preservada A volta do espécime de tietê-de-coroa ao Brasil é um marco para a ciência e para a história da biodiversidade do país. Ele não será exposto ao público no momento, mas estará à disposição de pesquisadores no MZUSP, onde sua presença já inspira debates sobre conservação e as perdas causadas pela devastação ambiental. Ilustração científica do tietê-de-coroa (Calyptura cristata) — Foto: Arquivo pessoal Mais do que uma peça rara, o tietê-de-coroa representa um lembrete do que ainda precisa ser feito para proteger o que resta da Mata Atlântica – e do que foi perdido no processo. VÍDEOS: Destaques Terra da Gente

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