Lar Comunidade ‘Teatro não é glória, é perseverança’, diz Fernanda Montenegro

‘Teatro não é glória, é perseverança’, diz Fernanda Montenegro

por admin
0 comentário
‘teatro-nao-e-gloria,-e-perseveranca’,-diz-fernanda-montenegro

Em plena quarta-feira de cinzas, pegar uma bela entrevista com a atriz Fernanda Montenegro no programa de Roberto D’Ávila (Globonews) — reprise (05/09/2015) ou não, é sempre um privilégio. E a dama do teatro fez revelações bastante peculiares. Se ela já for a vaiada alguma vez? “Não, mas já fiz um espetáculo muito vaiado. Não vou dizer qual. Mas os atores eram aplaudidos”, revela Montenegro. “Nem perguntarei”, diz D’avila. “Você é um gentleman”, conclui Fernanda. A atriz relembra que participou de espetáculos que eram grandes protestos. “Eu tenho dois espetáculos na vida, os dois dirigidos pelo Fernando (Torres, seu marido): ‘Beijo No Asfalto’ (Nelson Rodrigues), que durou apenas um mês. Nós ensaiávamos ‘A Megera Domada’ (William Shakespeare) à tarde e fazíamos o ‘Beijo’ à noite”, conta. “Com a renúncia do Jânio (Quadros, então presidente do Brasil), a peça acabou em um mês! Aquela multidão que a gente punha no teatro pra ver o Nelson )Beijo No Asfalto) e lá se foi também o nosso Shakespeare”, relata Fernanda. “E não havia um dia que uma pessoa não gritasse da plateia: protesto em nome da família brasileira!”, ressalta a atriz referindo-se à encenação da peça de Nelson Rodrigues. E mais: “Outro gritava: ‘esse cara é um tarado! Vou chamar a polícia!’ Enquanto alguns mandavam calar a boca e a gente tinha que parar a peça. Isso durou um mês inteiro. Hoje isso nunca aconteceria”, observa Montenegro. O Nelson (Rodrigues) era um personagem, não?”, comentou o apresentador. “Ele é especialérrimo!”, respondeu Fernanda. “Nelson é um filósofo! Ele tem que ser estudado na universidade, como linguagem. Os conceitos dele são socráticos. Ele é essência”, diz a maior estrela das artes cênicas brasileiras. “Ele era engraçado também”, complementa Roberto. “O engraçado dele é porque o que ele escreve é tão a gente que você ri de nervoso”, observa a grande atriz. “Você se reconhece tanto na obra dele que ri de nervoso. O teatro parece que não tem importância, mas se contar a história do Brasil pelos espetáculos que atravessaram esses séculos, a gente terá uma outra visão da história”, afirma Montenegro. “Você vem de uma geração de mulheres muito lindas, e você passou por cima de todas”, comenta D’ávila. “Hoje eu acho até que eu era bonitinha!”, comenta Fernanda com humor. “Às vezes eu acho até que eu era bonita, mas perto daquelas excelsas pessoas, mulheres deslumbrantes ficava difícil!”, completa a estrela premiada com o Emmy de Melhor Atriz em 2013 pela série “Doce de Mãe”. “Eu comecei a me achar um pouco mais nos anos 60 com o sucesso da Twiggy (top model britânica), porque ela era muito magra e eu também”. “Você tinha até um apelido em casa muito engraçado”, lembra o apresentador. “Era saraguela. Segundo me informaram, saraguela é uma ave com pernas longas. O meu avô italiano me dizia: você é uma saraguela!”, relembra a dama do teatro. Então Fernanda revela um fato pitoresco: “Uma das minhas grandes vitórias como mulher foi o seguinte: eu fui convidada para trabalhar num melodrama italiano que a companhia de Henriette Morineau ia fazer chamada ‘Mulheres Feias’. Eu fui contratada pra fazer a feia”, conta a atriz. E continua, revelando a sua reviravolta na história: “Com muita coragem, nem sei como eu tive essa coragem porque eu era muito tímida, eu disse que gostaria de fazer a sedutora. Era a que comia todo o mundo em cena: o tio, o primo, o namorado da feia. Era de uma sedução louca, e a maluca aqui chegou e disse que queria fazer a tal sedutora!”, conta. Enfim a atriz ganhou o papel da “sedutora” e revela a sua revanche: “A minha glória é que ninguém contestou que eu estivesse seduzindo aquele bando de homens em cena. Uma vez eu me olhei no espelho, vestida da personagem, e disse pra mim mesma: eu acho que eu tenho futuro!”. Roberto ri. “Te juro por Deus”, confirma Fernanda. E a atriz confidencia: “Eu saía do teatro e me achava uma coisa ‘chinfrin’, um pé de chinelo. É o teatro! Eu não quero outra vida. Não, não tem outra vida melhor do que essa. Mas não tem mesmo”, declara veementemente a maior atriz do teatro nacional. “Mas você está muito bonita mesmo, você não mexeu em nada do seu rosto”, elogia Roberto D’Ávila. “Não, não é verdade. Mas a gente acorda e quer viver”, despede-se como uma Fernanda Montenegro como uma verdadeira dama. Renato Kramer Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna “Antena”, na “Contigo!”, e fez críticas teatrais para o “Jornal da Tarde” e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a “Ilustrada” antes de se tornar colunista do site “F5”

você pode gostar